Egressos da Unesp fogem da mídia tradicional e se destacam com jornalismo independente

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Veículos jornalísticos fundados por ex-alunos trazem novos debates, personagens e interpretações para a esfera pública local e nacional

O termo mídia radical alternativa foi desenvolvido pelo pesquisador de comunicação John D. H Downing e diz respeito à mídia produzida em pequenas escalas sob diversas formas (rádios e tv’s comunitárias, fanzines, revistas, jornais impressos e online) que expressam narrativas contrárias à da mídia hegemônica.

Para o professor e doutor em comunicação Juarez Tadeu De Paula Xavier, “a grande importância das mídias radicais é pluralizar as possibilidades de leitura da realidade”. Portanto, a falta da diversidade de narrativas no jornalismo levaria uma visão monocromática dos acontecimentos.

A percepção de que o jornalismo bauruense necessitava de diferentes olhares motivou os ex-alunos Lorenzo Santiago, Bibiana Alcantara Garrido e Ana Carolina Moraes, do curso de jornalismo da Unesp, a investirem na criação de um novo veículo. O Jornal Dois nasceu em 2017 e teve como influência o contato de seus fundadores com movimentos políticos e sociais da cidade.

“A ideia de montar o jornal veio porque nós já frequentávamos esses espaços e sentíamos falta de um lugar em que pudéssemos contar suas histórias”, salienta Bibiana.

A grande diferença entre os veículos independentes e a mídia tradicional seria o formato de produção. Ao contrário da cobertura “hard news” dos grandes jornais, ou seja, do relato veloz das notícias cotidianas, os conteúdos abordados pela mídia independente buscam complexificar suas narrativas aprofundando o contato com a comunidade.

O papel do jornalista é muito mais o de entender a parcela da realidade que irá retratar, do que tratá-la como um fato único, verdadeiro e absoluto”, aponta Ana Carolina Moraes.

Para a jornalista Bibiana Garrido, o engajamento da população bauruense nas produções do jornal é um demonstrativo da necessidade de novas narrativas sobre a cidade. “Nós temos reportagens que chegaram a mais de 5, 10 e até 30 mil pessoas. Esse alcance demonstra a falta de uma comunicação mais humana, partindo de um repórter que se insere no contexto em que vai trabalhar”, analisou Garrido.

Contra-narrativas

A atuação do jornalismo independente está associada às discussões realizadas pelos movimentos em prol das minorias sociais. “O jornalismo trouxe, por exemplo, para a esfera pública o debate sobre a violência contra as mulheres, o debate com relação ao racismo e a violência contra LGBT’s”, enfatiza o professor Juarez.

Foi o florescimento das discussões raciais dentro da universidade, por meio da criação do primeiro coletivo negro, o terreno fértil para a criação do projeto Alma Preta. Fundado em 2014, é um portal de jornalismo especializado na temática racial do Brasil. A iniciativa surgiu encabeçada pelos unespianos Pedro Borges, Solon Neto e Vinícius Martins de Almeida, na cidade de Bauru.

Segundo, o Censo de 2010 do IBGE a presença de negros e pardos na produção jornalística é de apenas 22% do total de profissionais. Foto: Pedro Borges

Inspirados em iniciativas como o blog Que Nega é Essa da jornalista, também unespiana, Aline Ramos, os estudantes se engajaram em produzir um espaço em que coubessem reportagens, coberturas, colunas, análises e divulgação de eventos da comunidade afro-brasileira.

Levando questões abordadas pelo movimento negro da cidade, como temas relacionados ao genocídio da população negra, os estudantes participaram de conselhos culturais e políticos intensificando o enfrentamento ao debate racial.

Segundo Pedro Borges, o caráter contra-hegemônico das mídias independentes e radicais é o que possibilita o confronto com as contradições e problemas sociais. “A esfera pública criada pela mídia radical é um espaço de discussão e de propostas. Diferente da mídia tradicional em que a notícia é pautada pelos interesses do mercado”, afirma ele.

Como consequência, as mídias radicais revelam um potencial em pautar a grande imprensa e romper com os monopólios narrativos. Para Juarez, essa é uma das características principais do jornalismo independente. Confira o áudio da entrevista:

 

Nos dias de hoje, o portal Alma Preta ganhou projeção nacional. “No nosso primeiro ano o principal público do site era de Bauru, mas agora as principais cidades que leem o Alma Preta são capitais como São Paulo, Rio de Janeiro e Salvador”, explica Pedro Borges. Todas elas cidades brasileiras com uma presença significativa da população negra.

 

           Texto: Daiane Tadeu

Produção multimídia: Paula Berlim Gonçalves

Editora: Heloísa Teixeira Manduca

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