Apesar de “termômetro” para investimento, campeonato não reflete real situação do esporte nos municípios
Os Jogos Regionais são um campeonato destinado ao interior do Estado de São Paulo, que acontece todo ano, desde 1950, e é realizado pela Secretaria de Esporte, Lazer e Juventude do Estado de São Paulo (SELJ), em conjunto com os municípios–sede. De acordo com o Caderno de Encargos dos 63º Jogos Regionais de 2019, o objetivo é “favorecer o desenvolvimento da prática esportiva nos municípios”. O estado é dividido em oito regiões e Bauru compete na 3ª, junto com cidades como Jaú, Lençóis Paulistas, Botucatu, Piracicaba e São Carlos.
“Os Jogos Regionais seriam uma mini Olimpíada ou um mini Pan-americano”, compara Claudio Massad, coordenador e atleta de tênis de mesa que representa Bauru desde 1997. São 24 modalidades participantes, duas a menos que as Olimpíadas, e incluem esportes como vôlei, basquete, handebol, futsal e também bocha, capoeira e malha. Ano passado, Bauru se inscreveu em 23 modalidades e contou com 360 atletas.
A porta de entrada para o esporte de alto rendimento
O campeonato possui duas categorias, uma sub-20 e a livre, para quem tem acima de 20 anos. Os atuais técnicos de xadrez e ginástica artística feminina, Ronaldo Alonso Moreira e Deborah Cristina Muzeka Lanzzetti, participaram pela primeira vez como atletas – ele com 13 e ela 9 anos. Hoje, dirigem projetos voltados para crianças da mesma idade e que participam da mesma competição.
No ano passado, houve pelo menos 1332 participantes no sub-20. Ao considerar a participação de estudantes, os Jogos sempre são realizados no mês de julho para coincidir com o período de férias escolares.
Voltado para atletas de alto rendimento, os Jogos Regionais são vistos como uma porta de entrada para o mundo competitivo. As crianças entram em contato com atletas de diferentes idades e níveis de competição. “Se elas têm o sonho de poder ser campeãs olímpicas um dia, elas têm que vislumbrar outras equipes melhores do que elas para que possam se espelhar em pessoas melhores”, destaca a treinadora de ginástica artística.
Porém, o foco é passar para os Jogos Abertos, onde as melhores cidades classificadas das oito regiões competem entre si nas mesmas 24 modalidades.“Os Jogos Abertos são como um segunda fase de um vestibular, você passa pelos Jogos Regionais e vai para os Jogos Abertos, o nível é bem mais forte.”, aponta a atleta de tênis de mesa de 17 anos, Júlia Laina de Sousa, que já participou de três Jogos Abertos.
Um campeonato mais acessível
Os três técnicos apontam outro diferencial do evento esportivo: sua gratuidade. De acordo com Alexandre Zwicker, secretário da SEMEL, a Secretaria cuida de todas as etapas e infraestrutura dos Jogos Regionais. “Inscrição, alojamento, comida, transporte, logística, a gente fica sempre de sobreaviso para alguma ocasião de emergência, a gente leva vários funcionários, várias merendeiras, cama, beliche, toda a infraestrutura somos nós que levamos”, indica.
No entanto, não há uma verba exclusiva para os Jogos Regionais. Alguns times recebem do Fundo Municipal de Esportes e utilizam essa verba para financiar a equipe, exceto o atleta, e os gastos com outras competições, recebendo ajuda da Secretaria de Esportes e Lazer (SEMEL) apenas com contratação de treinadores, aluguel e contas da estrutura de treinamento.
O time de ginástica artística, por exemplo, não se enquadra nesse caso e precisa achar outros meios de arrecadar o dinheiro necessário para as competições. “Quem compra nossos uniformes somos nós, o ano passado a gente gastou R$ 3500 de bazar, a gente fez quatro bazares para conseguir arrecadar o dinheiro para comprar 18 collants”, ressalta Deborah Lanzzetti.
“Os Jogos Regionais são um campeonato tradicional. Eu, quando comecei a jogar, minha maior motivação era jogar os Jogos Regionais. É um campeonato muito bacana que você representa a cidade, você interagem com outras modalidades, porque normalmente a gente viaja só com tênis de mesa”, declara Claudio Massad.
Representar a cidade?
Apesar dos Jogos Regionais terem como objetivo o desenvolvimento do esporte municipal e proporcionar uma amostra do investimento destinado ao esporte por cada cidade, atletas podem representar outros municípios. “Acabei representando outras cidades, joguei um ano por Barra Bonita, um por Jaú, outro por Birigui”, indica Ronaldo Moreira.
Essa é uma prática comum entre os atletas e que pode ocorrer por diversos motivos, como a falta de vagas, de recursos ou, no caso de Ronaldo, para participar como atleta junto com seus alunos. Entre 2010 e 2012, Claudio Massad também já representou outras cidades. “Na época, não tínhamos o apoio financeiro para poder jogar por Bauru, para pagar viagens, receber ajuda de custo, etc”, afirma.
“[Os Jogos Regionais são] o que realmente mostra a força que as cidades têm dentro do esporte, o investimento que elas fazem dentro do esporte, não só por modalidades específicas, mas de uma maneira geral”, destaca Ronaldo Moreira.
Há também a contratação de times compostos por atletas de fora da cidade para participar dos Jogos Regionais. De acordo com Ronaldo, desde que começou a jogar, quase 20 anos atrás, muitas cidades ricas contratavam times inteiros para representar suas cidades. Claudio concorda que muitas contratam atletas apenas para jogar o campeonato, principalmente cidades-sede.
Para o time de xadrez, Piracicaba era seu maior rival por possuir uma política de contratação para formar um time com “os melhores jogadores do Brasil”. “Era brigar para ficar em segundo lugar, não tinha jeito”, revela o técnico de tênis de mesa.
O Secretário da SEMEL, Alexandre Zwicker, se posiciona sobre a política de contratação:
A Secretaria do Esporte, Lazer e Atividades Motoras de Piracicaba afirma que a cidade não contrata atletas. “Atualmente, Piracicaba se adequou ao Marco Regulatório, portanto, o dinheiro repassado pela prefeitura às entidades é fiscalizado, ou seja, elas precisam prestar contas de tudo“, explica Leandro Bollis, assessor de imprensa.
O Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC) que Leandro menciona é uma série de normas, estabelecidas em 2014, voltadas para organizações privadas que prestam serviços à sociedade civil. De acordo com o site do Ministério da Cidadania, o MROSC proporciona a desburocratização do processo de prestação de contas, a transparência na aplicação dos recursos públicos e a possibilidade de maior planejamento para a execução de parcerias.
Até o fechamento da matéria, não houve resposta da Secretaria de Esporte e Cultura de São Carlos.
Repórter: Nádia Linhares
Produção multimídia: Lara Ignezli
Editora: Júlia Belioglo