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A responsabilidade não é só delas

É instintivo. Quando se fala em prostituição, a primeira imagem que vem à mente é a da prostituta. Mas, acima de um modo de trabalho, a prostituição é um processo. E a garota de programa não o articula sozinha.

A prostituição tem outros atores em sua constituição como processo. Um deles é o cliente. Outro, a sociedade e suas opiniões.

O cliente

“Se não há demanda, não há oferta”. No decorrer do texto, você vai perceber que este foi um dos argumentos mais utilizados para responder à pergunta “o que você pensa dos clientes da prostituição?”. Isto é o que a sociedade pensa dos clientes. Mas o que eles têm a dizer?

Dois homens que já frequentaram casas de prostituição aceitaram dar entrevista para o Repórter Unesp. A identidade de ambos será preservada.

Repórter Unesp: Quando e como foi a primeira vez que você foi a uma casa?

Cliente 1: Eu tinha 18 ou 19 anos. Estava com bastante vergonha, não queria ser visto. Achei que as mulheres já chegavam se oferecendo, com trajes menores, se insinuando. Foi diferente do que eu esperava.

Cliente 2: Foi em Ribeirão Preto, em 2008. Eu só fiquei no barzinho bebendo com meu primo e conversando com umas mulheres que não estavam em serviço ou que já tinham ganhado o suficiente e ficavam lá embaixo só conversando com os frequentadores.

RU: Por que você buscou?

C1: Tinha acabado de sair de um namoro. Estava triste, deprimido.

C2: Eu tinha acabado de fazer 18 anos e meu irmão já tinha insistido muito para que eu fosse e “usasse” o serviço, mas eu não queria fazer nada. Eu tinha bastante curiosidade de conhecer. Estava com meu primo e ele perguntou se eu queria ir só para conhecer. Ele também não transaria, até porque ele namorava na época. E eu fui.

RU: Como é o ambiente? E as pessoas? O local, por exemplo, você imaginava de um jeito e era de outro. Como você descreveria o local?

C1: Sou péssimo em descrição. As pessoas são vazias e escondem uma tristeza profunda. Quanto ao ambiente, não sei dizer.

C2: Era um bem chique em Ribeirão, e nem parecia um puteiro, parecia mais uma casa de shows. O local era bem limpo e tinha os quartos no andar de cima – que eu nem cheguei a conhecer. Sobre quem frequenta, eu acho muito pessoal. Tenho amigos que frequentam quase todo mês e penso que não tem emoção alguma, que é somente pelo físico. Não vejo sentido nisso, mas eu não julgo, não falo que é errado ou certo, pois isso é muito pessoal.

RU: Você procuraria em um momento que não fosse de tristeza?

C1: Eu, especificamente, não.

C2: Eu fui só essa vez e não voltaria porque não gosto. Nunca transei com uma prostituta, mas penso que não seria gostoso, em todos os sentidos: físico, mental… Não sei se sentiria tesão. Não me sentiria confortável. Não seria agradável.

RU: Antigamente, os meninos eram iniciados sexualmente com prostitutas. Você acha que esse costume mudou? A prostituição tem um significado diferente nos dias de hoje?

C1: Eu acredito que mudou sim. Para quem se prostitui, acho que foi e sempre será preferencialmente o dinheiro. Para quem procura esse tipo de estabelecimento, antigamente era para iniciação sexual, hoje em dia eu vejo as pessoas procurando por outros motivos.

C2: Acho que diminuiu o incentivo para o moleque da casa se mostrar macho. Acho que o pai não tem mais a necessidade de levar o filho no puteiro como um processo de passagem. E tem outra coisa: o conceito da prostituição mudou muito. Hoje, as mulheres não fazem apenas para alimentar a família. Muitas assumem como um complemento de renda para pagar uma faculdade, então elas não pensam em fazer daquilo seu meio de vida, mas sim um subsidio para profissões mais “dignas”.

A sociedade e suas opiniões

A sociedade é outro pilar do processo da prostituição. As mais variadas opiniões – de quem se distancia ou se aproxima da profissão, de quem a denigre ou julga como uma atividade como outra qualquer – refletem as ideias do meio onde a prostituição se insere e existe. O Repórter Unesp foi às ruas para ter uma ideia mais clara do posicionamento da sociedade a respeito.

A pesquisa abaixo foi feita com 52 cidadãos de Bauru, o que representa uma pequena parte da população da cidade e ainda menor da sociedade como um todo. Ainda assim, os números ajudam a compreender como a prostituição é vista atualmente.

Info Prostituição editado

Durante o levantamento dos dados, ficou claro que, para a maioria dos entrevistados, a mulher é a prostituta e o homem é o cliente. Nenhuma das 52 pessoas utilizou a expressão “garoto de programa” ou “a cliente”.

Outro dado interessante é o de que apenas uma pessoa se mostrou favorável à atuação dos clientes. As outras 51 se posicionaram contra – algumas radicalmente – ou de forma neutra. Porém, cinco pessoas se disseram à favor da prostituição, o que denuncia que a prostituição ainda é entendida como um processo que minimiza as atuações do cliente e da própria sociedade – apenas dois entrevistados pontuaram que as políticas públicas poderiam ser mais eficientes.

Reportagem: Leonardo Zacarin

Produção Multimídia: Lucas Leite

Edição: Felipe García

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