Jovens começam a consumir álcool cada vez mais precocemente

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Segundo o último Levantamento Nacional sobre o Uso de Drogas, realizado pelo Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (Cebrid) e pela Secretaria Nacional Antidrogas (Senad), 35% dos brasileiros tiveram seu primeiro contato com bebidas alcoólicas entre 15 e 17 anos, enquanto 52% experimentaram a partir dos 18 anos – idade legal para se consumir álcool. Os dados também indicam que ao passar dos anos, a idade de iniciação no consumo de álcool vai se tornando cada vez mais precoce e a quantidade de bebida vem se tornando maior.

A discussão sobre o consumo de álcool na adolescência e no início da juventude tem importância porque o crescimento e o desenvolvimento tanto corporal, quanto comportamental ocorrem em maior intensidade nesta fase. Hábitos criados nesse período podem perdurar para o resto da vida.

As razões pelas quais jovens e adolescentes suprem essa vontade/necessidade, mais cedo que o permitido são diversas. Em uma pesquisa realizada pelo IBGE, foi apontado que as principais motivações são: ficar feliz, ser uma válvula de escape, se descontrair, ganhar coragem, ter prazer, curiosidade e vontade de ser aceito. De maneira geral, tais pontos são resultados da cultura do álcool, que se mostra profundamente intrínseca na sociedade brasileira.

O primeiro contato

Luis Alexandre Ambrósio, 18, acredita que a sociedade é a maior influenciadora para que jovens comecem a beber. ” É muito difícil encontrar jovens nos dias de hoje que nunca experimentaram bebidas alcoólicas”, conta. 

“Já experimentei bebidas alcoólicas com meus pais e com meus amigos”, conta José Augusto Maurino, de 15 anos. Ele afirma que beber o atrai pois gera “a curtição com os amigos”, mas tem consciência que “pode levar uma pessoa a ficar fora de controle” e por ter alguns exemplos na família, José completa dizendo que “espera estar livre do álcool pelo resto de minha vida”. Em tom de brincadeira, o adolescente ainda comenta que sua irmã mais velha, de 21 anos, bebe demais e ele não quer seguir seu exemplo.

Representando os 9% dos brasileiros que tiveram seu primeiro contato com a bebida entre 12 e 14 anos, Ana Eliza Pompeu, 18, relembra: “na festa de aniversário da minha irmã, peguei uma garrafa de cerveja escondido junto com minha amiga. Eu tinha uns 13 anos, mas só comecei a beber mesmo perto dos 15 com meus amigos.” Luis Alexandre teve uma história similar. Ele relata que a primeira vez que consumiu bebida alcoólica “foi em um churrasco com seus amigos de escola quando tinha entre 13 e 14 anos.” Ao mesmo tempo em que ambos começaram a beber precocemente e continuam a manter esse hábito, eles alegam que a bebida em si não os atrai, “só bebem para se divertir com os amigos”.

Esses casos apontam que apesar de ser ilegal e existirem políticas públicas proibitivas, é fácil ter acesso ao álcool. Uma pesquisa realizada pela equipe do Dr. Ronaldo Ramos Laranjeira, médico psiquiatra, PHD em Dependência Química e professor de Psiquiatria na Faculdade de Medicina da Universidade Federal de São Paulo, em duas cidades do estado de São Paulo (Diadema e Paulínia), mostrou que adolescentes conseguiram comprar bebida alcoólica em 95% dos estabelecimentos visitados.

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O consumo de álcool pelos jovens se dá em todos os âmbitos sociais e, mesmo em casos de ilegalidade, é exibido sem restrições. (Foto: Divulgação)

Em outra pesquisa do IBGE, donos de estabelecimento afirmam que não vendem bebidas para menores, “mas acabam se contradizendo ao afirmar que os jovens estão com “caras de mais velhos”, e por isso, fica difícil identificar quem tem 16, 17 anos.” Douglas Oliveira, 24, conta que quando começou a beber, aos 13 anos, “tinha um barzinho em seu bairro, que vendia para todos”, demonstrando que a regulação existe, mas não é necessariamente respeitada.

Proibir adianta?

Pesquisas apontam que a aceitação do álcool pelos pais é maior que em relação a outros tipos de drogas, pois consideram que “beber faz parte da adolescência”. Alguns pais proíbem o álcool sem discussão, enquanto outros acreditam que o diálogo é a melhor forma de apresentar esse tema, a fim de prevenir danos maiores.

André Menezes, pai de um jovem de 19 anos, fala que sempre tentou mostrar o que são bebidas alcoólicas e preferia que seu filho as experimentasse em casa. Para ele, beber não é um tabu e não deve ser algo para ser feito escondido. Ele relata: “sempre frisei para ele [seu filho] o quanto o álcool pode fazer mal e como deve ser bebido, sem exagero. Também falo constantemente que pode causar não só problemas de saúde, mas danos futuros para a vida dele.”

Lúcia Santos de Assis, mãe de três homens de 23, 28 e 31 anos, enxerga a forma de lidar com a bebida de uma forma similar à de André. Ela conta que conversou com todos seus filhos e “sempre os alerta do perigo das bebidas alcoólicas.” Mesmo assim, ela desabafa que não gosta que eles se relacionem muito com elas.

Em 2013, a Ambev promoveu, juntamente a Maurício de Sousa Produções, cartilhas e materiais publicitários incentivando a conversa aberta sobre o tema nas escolas e dentro de casa.

O projeto previu impactar 5 milhões de famílias com a ação.

Fiz 18 anos e agora?

Quando a legalidade chega e os adolescentes se tornam adultos perante a lei, vem com ela também a dor e a delícia, como já dizia Caetano Veloso, de poder beber livremente, mas também saber alinhar essa liberdade com as responsabilidades. Ana Eliza Pompeu expressa que quando fez 18 anos – em dezembro de 2016, perdeu um pouco da vontade que tinha de beber quando era mais nova. “Antes de me tornar maior de idade,  eu achava que ia ser a melhor coisa da vida, foi um fogo só. Antes existia aquele desejo por ser algo escondido e quando ia comprar bebida e não pediam RG, me sentia demais! Mas quando completei, não fez diferença”, revela.

Luís Alexandre, que completou 18 em março deste ano, não acha que completar a maioridade foi um ponto decisivo na forma que consome o álcool. Voltando na questão da facilidade de adquirir bebidas, ele conta que “nunca teve dificuldade de ingerir bebida alcoólicas sendo menor de idade.” De qualquer forma, assume: “mas que é muito mais tranquilo beber sendo maior de idade, é sim.”

Douglas, assim como Ana Eliza, começou a ver o álcool com outros olhos quando completou 18 anos. Ele diz que “quando eu era mais novo, via os meninos mais velhos bebendo e achava que era uma coisa muito legal. Hoje vejo que não, dá para se divertir sem o álcool.”

Ser maior de idade, no entanto, não é o único fator que pode ser um ponto decisivo na relação do jovem com o álcool. A entrada na faculdade e a vida universitária tem se mostrado, cada vez mais, como um grande catalisador desse relacionamento.

Universidade e mudanças

Quatro jovens universitários, estudantes de Design na UNESP de Bauru, – Ana Beatriz Frozoni, 23; João Paulo Marques, 20; Pedro Nalon, 19 e Nicolas Messias, 21 – foram questionados se a universidade mudou a forma como eles veem a bebida e a resposta foi unânime: “sim”. Eles explicam que a facilidade de acesso e a quantidade que sempre está disponível são uns dos principais motivos pelos quais passaram a beber mais nessa fase de suas vidas.

Os moradores da República De Quatro compartilham suas experiências relacionadas ao consumo de álcool na universidade.

O I Levantamento nacional sobre o uso de álcool, tabaco e outras drogas entre universitários das 27 capitais brasileiras  apontou que um em cada quatro universitários relatou consumo do álcool no padrão binge nos 30 dias. “Binge drinking” é uma expressão que indica “uma ocasião de beber pesado episódico”, definido pela ingestão de cinco ou mais drinques em uma única circunstância. As consequências desse ato “abrangem desde queda no desempenho acadêmico, perda de vivências sociais e cognitivas apropriadas, relações sexuais sem proteção ou ainda indesejadas, até a morte, seja por acidentes, lesões, ou mesmo coma alcoólico – grau tão severo de intoxicação que afeta de forma fatal o funcionamento de todo o corpo e do cérebro”, de acordo com o Portal do CISA.

A maioria dos estudantes alegam que beber é uma das – senão a maior, forma de integração dentro do ambiente universitário e é irreal pensar que esse hábito deixará de existir. A questão que deve ser levantada é a forma controlada de consumir o álcool para que males maiores não sejam desencadeados. Palestras, debates e diálogos, até mesmo entre seus amigos mais próximos, podem ser maneiras efetiva de não ignorar essa questão no dia-a-dia. A consciência, partindo do individual e se espalhando para o coletivo, pode fazer diferenças para um cenário mais positivo e com menos abuso dessa substância.

Questões de saúde

Como já é de conhecimento geral – e inclusive, não se mostra como nenhum impedimento, beber faz mal à saúde. Esta é uma mensagem difundida socialmente que se encontra em slogans e propagandas que nos bombardeiam constantemente. Consumir bebidas alcoólicas antes dos 18 anos pode ser ainda mais danoso. De acordo com a Equipe do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (CISA), “além do fato de ser ilegal, o uso de bebidas alcoólicas por menores de idade oferece alto risco tanto para o indivíduo quanto e para a sociedade. Não existe dose segura ou tolerada para menores de idade”.

Eles explicam que “o consumo de bebidas alcoólicas por adolescentes compromete o sistema nervoso central (SNC) que ainda encontra-se em desenvolvimento. Desta maneira, suas vias neuronais podem se tornar mais suscetíveis aos danos causados pelo álcool, podendo levar ao comprometimento de várias funções.”  A equipe também apontou estudos que “mostram que indivíduos que começaram a beber antes dos 15 anos têm 5 vezes mais chance de desenvolver problemas relacionados ao uso de álcool do que aqueles que começam a beber após os 21 anos. Além disso, para a vida adulta, o uso de álcool na adolescência é associado a maior consumo e abuso de outras drogas e mais comportamentos impulsivos.” Quando o uso se torna crônico e em quantidades exageradas, o indivíduo podem desenvolver complicações em diversos órgãos e problemas sérios de saúde, como o alcoolismo

Reportagem: Julia Gonçalves

Produção Multimídia: Jhony Borges e Patrícia Konda

Edição: Karina Rofato

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