Opinião | “Eu Escolhi Esperar” e a mobilização da juventude
O movimento Eu Escolhi Esperar se popularizou e vem conquistando cada vez mais adeptos no Brasil
“Eu costumo falar que o Eu Escolhi Esperar mudou a minha vida” – é assim que Jaqueline Alves, 21, traduz em palavras o significado de sua escolha dos últimos 5 anos. “Eu Escolhi Esperar” (EEE) é uma campanha criada em 2011 pelo pastor Nelson Neto Junior, apoiada por pessoas que escolheram não fazer sexo antes do casamento. Jaqueline é estudante de Relações Públicas e conheceu a mobilização através do Twitter EscolhiEsperar, no mesmo ano de sua criação. Ela conta que começou a acompanhar também o blog: “Eu fui vendo que, realmente, não era só o casamento virgem, que é o que todo mundo acha que é. No começo eu também achava que era.”
Assim como Jaqueline disse, Nelson explica que a ideia do EEE é “promover a cultura do Reino de Deus para o relacionamento entre solteiros. Vai muito mais além que virgindade. Pregamos santidade e pureza na vida sexual e emocional, a fim de gerar filhos de Deus saudáveis e, consequentemente, futuras famílias saudáveis.”
Jaqueline é evangélica e participa ativamente das atividades de sua igreja. Ao falar da campanha, seus olhos chegam a brilhar. Ela se sente muito grata por ter escolhido esperar. A estudante possui, inclusive, vários artigos da campanha – livros, camisetas, acessórios. Já participou de dois seminários organizados pelo EEE e afirma que eles são muito bons.
Nelson, pastor e idealizador da mobilização, resume que o EEE é a história de sua vida. “Com 10 anos recebi Jesus como senhor da minha vida e com 12 anos tomei a segunda decisão mais marcante da minha vida, eu escolhi esperar”, completa o pastor. Ele explica que a campanha começou de forma singela nas redes sociais, mas logo alcançou um considerável número de jovens adeptos – hoje, estima-se que 2 milhões deles aderiram à causa. Jaqueline é uma entre muitos outros.
Em seus relacionamentos, Jaqueline conta que sempre foi muito clara sobre sua decisão e sempre muito respeitada. Ao contrário de Cássia Santos, 20, que também conheceu a campanha em 2011 através do Twitter. “Eu já terminei um namoro porque o desesperado não concordava em esperar. E depois eu descobri que foi a melhor coisa que eu poderia ter feito porque o cara não me amava, queria só se satisfazer”, afirma a estudante.
Além das relações amorosas, escolhas como de Cássia, Jaqueline e Nelson também podem gerar alguns entraves. Quando entrou na faculdade, Jaqueline confessa ter sentindo certo desconforto com os colegas, mas com o passar do tempo a situação melhorou. Cássia comenta que também recebe muitos julgamentos: “Eu ouço coisas como ‘nossa, como você aguenta?’, ‘olha aí a virjona’ etc. Mas é algo tão sólido em mim que eu já não me importo com isso.”
Nelson comenta que esse tipo de visão e até mesmo a rejeição ainda é muito comum, especialmente com os homens. “Essas situações sempre acontecem quando alguém tem algum valor ou características que fogem do padrão social atual”, completa. A mobilização tem princípios cristãos e, segundo Nelson, ela atua em duas áreas específicas – sexualidade e vida sentimental. Ainda assim, ele e Jaqueline confirmam que existem integrantes que não são evangélicos ou ligados à religião.
Jaqueline, Nelson e Cássia são exemplos de como o ser humano é capaz de se mobilizar em uma causa, independente de qual ela seja. Exemplos de que todos nós seguimos um ponto de vista, de que podemos buscar por eles e de que tudo pode ser uma questão de escolha.
Opinião
Es.co.lher. Verbo transitivo. Direto, indireto, difícil. Em um mundo com inúmeras alternativas, escolher não se trata de uma simples ação, mais ainda quando a escolha lida com um novo modelo de vida.
As tentações e prazeres que envolvem a vida do ser humano são antigos. O homem sempre procurou satisfazer-se – seja fisicamente, economicamente, socialmente, religiosamente. O sexo, a comida, o dinheiro e o lucro, as ideologias, as crenças religiosas. Tentativas de satisfação.
Escolhas, obviamente, são extremamente pessoais. É difícil vê-las sob um ponto de vista neutro e isento de qualquer experiência também pessoal. Não à toa, sempre repetimos aquele velho ditado de que futebol, política e religião “não se discute”. Será?
A campanha Eu Escolhi Esperar vem na contramão de um mundo cada vez mais liberal. Tão liberal que às vezes pensamos que tal campanha e escolha seria um retrocesso. Ilusão. Afinal, se estamos nos tornando mais liberais e abertos ao livre-arbítrio, aceitar tais pensamentos e respeitá-los é, sim, sinônimo de plena liberdade. E, por incrível que isso pareça aos olhos atuais, a campanha só cresce entre os jovens.
O sexo é um dos tabus que nossa sociedade construiu e fortificou, especialmente quando trata da figura feminina. A vulgaridade foi atribuída, de forma equivocada e machista às pessoas – principalmente mulheres – que falam ou deixam claro suas atividades sexuais. Ao mesmo tempo, decidir privar-se disso, seja até o casamento ou para sempre, também sofre ataques constantes. Extremos necessários, fundamentais para a construção de uma visão crítica e dialética. A Campanha Eu Escolhi Esperar é reflexo disso – de uma realidade que deve conviver com opostos, de forma respeitosa, a fim de nos levar, cada vez mais, a um mundo onde as diferenças e singularidades existam harmoniosamente.
Reportagem: Camila Trindade
Produção Multimídia: Ingrid Woigt
Edição: Laiza Castanhari