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Tatuagem: a mancha social

A prática da tatoo e o estigma em extinção que ainda assombra

Maria Tebet

Investir sobre o próprio corpo é sinal de busca por originalidade. Modifico-me para construir uma identidade. A tatuagem, como modificação permanente corporal é ferramenta para o novo, para o diferente, para o estranho. Ou costumava ser.

'Jhonny Tattoo', como é conhecido, está no ramo há mais de 30 anos (Foto: Maria Tebet)

O “absurdo” de ontem caminhará naturalmente amanhã. A visão da tatuagem como sinal de rebeldia e exibição saiu de foco, dando espaço para novas perspectivas acerca dessa forma de expressão. “Para você ver como é o ser humano. Tudo que era estranho antigamente, hoje já não é”, diz Johnny, que trabalha com tatuagem há mais de 30 anos.

Passado sombrio

Homem de gelo, múmias, índios, bárbaros. Desde os primórdios os seres humanos transformam seu corpo e dialogam com diversos significados através da impressão definitiva de pinturas na pele. A prática nasceu no Taiti, no século XVIII, e rumou para a Europa virando acessório para cavalheiros da aristocracia.

Antes feitas com ferramentas manuais, as tatuagens – bastante dolorosas – podiam demorar meses ou anos para serem concluídas. A tecnologia trouxe acessibilidade à prática da tatuagem, também fortalecendo seu caráter exótico e extraordinário. Pessoas tatuadas eram atração em circos, parques e feiras.

A “tattoo entrou no Brasil pelo submundo, pelo porto, pelos marinheiros”, explica Johnny, comentando sobre a descendência dos tatuadores e o estigma ruim que a tatuagem carregou – ou que para alguns ainda carrega – durante tanto tempo. Ela foi símbolo das classes marginais. Não só para os marinheiros, mas para soldados, prisioneiros e prostitutas, cada qual com seus significados.

Também foi forma de protesto com os hippies e amantes do Rock na cont

racultura no Brasil.”Eu sou de uma geração em que nós éramos transgressores de verdade, eu tinha tatuagem para dar tapa na cara da sociedade, provar que sou do bem e tenho tattoo”, diz Marcelo, tatuador profissional desde 1996.

Símbolo em transformação

A simbologia e representatividade negativa da tatuagem ainda deixam seus sinais na sociedade contemporânea. “Saía com o braço desenhado e minha mãe me batia”, lembra Alcyr, tatuador interessado desde pequeno por tattos. A aceitação, principalmente por pessoas mais velhas ou moradoras de cidades pequenas, por exemplo, ainda é um obstáculo. A artesã e esposa de Alcyr, Anabell, que trabalha com ele no estúdio, comenta que até no supermercado percebe rejeição pelo fato de ter muitas tatuagens.

É na maioria das vezes entre olhares e cochichos que o preconceito se manifesta. Seja na fila do banco ou em uma entrevista de emprego. Mas a atenção que a tatuagem atrai nas pessoas pode ser benéfica, e é possível encontrar quem nunca sofreu nenhum tipo de preconceito.

Como Angelita, tatuadora no mesmo estúdio de Johnny, formada em estética e dedicada também à maquiagem definitiva. “Muito pelo contrário, quando eu entro em um lugar e chamo a atenção, sempre aparece uma coisa legal, uma oportunidade.”

E é nessa positividade que os reais amantes da tatuagem se apoiam, encarando-a como expressão de arte e estilo de vida, contribuindo para a mudança gradativa de seu conceito na sociedade. Mesmo com os inevitáveis modismos, o exercício cultural que a tatuagem proporciona – o de se comunicar com a realidade e significar identidades e comportamentos – deve sempre ser mantido sobre a pele.

SAIBA MAIS:

Galeria de Fotos – Tatuagens e estúdio

Texto: “Do íntimo ao banal” por Gabriel de Castro

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