O que a especulação imobiliária tem a ver com você
Recorrente e atual, a especulação imobiliária sempre dá as caras na maioria das discussões sobre o uso dos espaços da cidade. Ela é sutil: pode passar despercebida a um transeunte desavisado que se maravilha, boquiaberto, com a grandiosidade de um condomínio fechado, nos arredores da cidade.
Peça chave no setor de construção e venda de imóveis, a especulação consiste em agregar valor a um pedaço de terra da cidade, tornando-o mais atraente e rentável, melhorando sua localização, sem que o proprietário do terreno precise fazer qualquer coisa (ou mudá-lo de lugar).
O pesquisador em Planejamento Urbano, Renato Saboya, da Universidade Federal de Santa Catarina, explica em artigo do Portal Urbanidades, que é possível tornar mais cara e aumentar a qualidade de uma área específica da cidade através do fornecimento de “infra-estrutura (água, esgoto, energia), serviços urbanos (creches, escolas, grandes equipamentos urbanos)” e “melhorias realizadas nas condições de acessibilidade (abertura de vias, pavimentação, sistema de transporte público)”.
Áreas próximas a shoppings, centros comerciais, escolas, com acesso a transporte público e redes de esgoto e luz, e de fácil interação com o restante da cidade são, geralmente, áreas com preços mais elevados. Um espaço torna-se mais caro, também, quando vizinho a áreas piores ou mais precárias, o que, por contraste, valoriza a nova construção, e força melhorias no entorno dele. Esse é o caso de condomínios afastados do centro da cidade e vizinho de áreas pobres, conforme aponta Saboya.
O que esses mecanismos têm em comum é que todos , amplamente, forçam investimentos em melhoras estruturais, por parte dos cofres públicos, o que leva à uma das principais consequências da especulação imobiliária: o fato de o lucro proveniente das melhorias públicas servirem a uma finalidade particular, por meio da “distribuição coletiva dos custos de melhoria das localizações, ao mesmo tempo em que há uma apropriação privada dos lucros provenientes dessas melhorias”, nas palavras do pesquisador catarinense.
A pesquisadora em Mobilidade Urbana e Acessibilidade, Amanda Carvalho, do Centro Universitário Belas Artes de São Paulo, afirma que existem mecanismos para frear a especulação imobiliária, dentre os quais destaca o Estatuto da Cidade e dos Planos Diretores, e a outorga onerosa do direito de construir.
Para que o trânsito flua, as construções se organizem, e as pessoas interajam com o lugar onde vivem, toda cidade possui um Plano Diretor, que define as prioridades e os objetivos do planejamento urbano, assegurando zonas de uso social, comercial, industrial e residencial, organizando o espaço urbano. “Existe um conjunto de regras que regularizam e controlam o uso do solo, como o máximo de altura que uma determinada construção pode ter, o máximo de espaço que ela pode ocupar”, explica Carvalho. Se um condomínio fechado, por exemplo, vai “usar mais do que pode”, como diz descontraída a pesquisadora, o mecanismo da outorga onerosa do direito de construir, por exemplo, exigirá uma compensação ou taxação elevada sobre os excessos daquele espaço. No entanto, o encontro entre legislação e mercado é bastante delicado, e as soluções encontradas nem sempre são baseadas, apenas, na escritura fria da lei.
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