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O papel da apostila no sistema de ensino brasileiro

O governo nacional tem objetivos definidos para cada âmbito e nível de educação. Os padrões de ensino aplicados visam formar uma criança a partir de um ideal de ser humano. Uma forma de educação designada como transformadora para a sociedade pode, ao mesmo tempo, ser coercitiva. Nesse sentido observamos, no Brasil, o padrão de ensino em apostila.

A última grande reforma da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, sancionada em 1996 (ou LDB/96), na época do governo de Fernando Henrique Cardoso, deu às escolas autonomia, mesmo que mais administrativa.

Os livros didáticos, avaliações, programas e cursos de formação, porém, permaneceram centralizados. “Há pouca diferença entre os materiais utilizados nas diferentes redes e sistemas de ensino, seja municipal, estadual ou federal”, é o que diz Maria José da Silva Fernandes, professora do Departamento de Educação da UNESP Bauru, atuante no programa de pós-graduação em educação escolar da UNESP Araraquara. “Se você tem uma gestão democrática, isso significa que a escola tem autonomia para escolher os conteúdos e a metodologia adotada”, ela diz.

No entorno desta legislação, permanecem contradições como o uso recorrente e pressuposto do mesmo tipo de método e de material pedagógico em diferentes lugares, negando diferenças sociais e culturais de cada região. “Como você pode achar que um jovem do interior do Nordeste tem as mesmas necessidades que um jovem da capital? Mas as matérias não levam isto em consideração”, exemplificou Maria José.

Outro ponto, que tem reforçado (e agravado) o uso enviesado de materiais padronizados é a relação entre a educação pública e a rede privada. O material que convier à sua autonomia financeira será o material que possa garantir aprovações em um modelo de ensino que se sintetiza como um projeto de formação para o vestibular. A proposta do vestibular tem íntima relação com o modelo cartilhado e padronizado de ensino.

gestão da educação pelo Governo

(Fonte: Professora Maria José Fernandes)

O vestibular pede, a apostila cobra

“Principalmente nas redes privadas… O que é que as escolas almejam? Aprovar os alunos nos vestibulares. Não é a toa que a gente vê todo ano o outdoor cheio de quantas pessoas aprovaram, fazendo propaganda. O trabalho é ditado pelos vestibulares”, esclarece Maria. Nos últimos anos o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) apareceu como um desvio nesse enviesamento.

Ao explicar as diferenças e semelhanças entre Enem e os demais vestibulares, Maria acredita que o exame introduziu algumas mudanças, mas ambos induzem a formatação do conteúdos apostilados seguindo um padrão. “Não é a questão da formação do aluno enquanto sujeito, de se formar para autonomia, mas sim o que se cobra lá fora”, ela conta.

Mesmo na rede pública há o uso do material produzido pela rede privada de ensino: compra-se o material para vestibular, sendo que ele se baseará na informação de outros professores. Segundo a professora isso vai acarretar na transferência de recursos públicos para o poder privado: “na verdade, essa é a coisa mais antiga que a gente tem (a cartilha), porque um material apostilado não deixa de ser aquilo que se critica muito na Pedagogia”.

A professora detalha sobre as apostilas dos cursinhos privados, que não passam pelas avaliações do MEC: “Todo esse mercado que se criou em torno dessas publicações não passam pela avaliação de ninguém. Fazem na verdade um grande resumo do que os livros fazem. Uma forma muito grosseira e reducionista”, aponta Maria José.

Reportagem: João Vitor Reis

Produção Multimídia: Julia Germano

Edição: Mayara Reis

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