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Uma moda para todos

A Moda Inclusiva dá os primeiros passos para seu reconhecimento no Brasil por meio de iniciativas como o Concurso de Moda Inclusiva

O Brasil tem mais de 45 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência, número correspondente a 23,9% da população, segundo o censo de 2010 do IBGE. Essas pessoas muitas vezes encontram dificuldade para conseguir roupas confortáveis e funcionais. Com este pensamento, surge a moda inclusiva.

De acordo com a designer Drika Valério, a moda inclusiva é “a moda adaptada com foco em pessoas com mobilidade reduzida e deficiência. Portanto, ela serve pra qualquer tipo de pessoa, inclusive pessoas com deficiência, sem diferenciar usuários”. Para Drika, é uma temática que dificilmente será levada a sério pelas grandes magazines por não ser considerada um padrão de beleza. “O assunto ainda é novo e de pouco conhecimento da população, pois pensa-se que moda inclusiva é somente para pessoas com deficiência”, explica.

Em 2011, o projeto de conclusão de curso da faculdade de Drika foi o desenvolvimento de um Vestido de Noiva Inclusivo. O trabalho foi reconhecido no âmbito nacional e internacional, com participações em eventos no Rio de Janeiro, Natal e São Paulo. Foi nessa época também que nasceu a empresa Somos Todos Nós. “Surgiu a necessidade em ampliar produtos e serviços e dar continuidade ao projeto com a empresa Somos Todos Nós”, conta.

O design inclusivo ainda precisa lutar pelo seu reconhecimento e espaço em grande lojas, já que não atende ao padrão de moda pré-estabelecido. [Foto: Moema Novais/Repórter Unesp]

O design inclusivo ainda precisa lutar pelo seu reconhecimento e espaço em grande lojas, já que não atende ao padrão de moda pré-estabelecido [Foto: Moema Novais/Repórter Unesp]

A Profa. Dra. Susy Amantini é professora e coordenadora dos cursos de Design, Design de Moda e Design de Interiores na Faculdades Integradas de Bauru (FIB). Segundo ela, o design inclusivo deve ser pensado para todas as pessoas, embora o conceito ainda esteja em evolução. “A importância [da moda inclusiva] está justamente na possibilidade de que todos tenham as mesmas oportunidades em utilizar produtos, serviços e ambientes que incluem as necessidades do maior número possível de pessoas ou usuários”, afirma.

Susy foi orientadora de Drika Valério no projeto do Vestido de Noiva Inclusivo e hoje acompanha a participação de seus alunos em eventos sobre moda inclusiva. “Acredito que o design inclusivo não sugere que é sempre possível (ou apropriado) para projetar um produto que atenda às necessidades de toda a população. Em vez disso, o design inclusivo orienta uma resposta no desenvolvimento de um projeto que seja adequada à diversidade da população, por meio, por exemplo, do desenvolvimento de uma família de produtos e seus derivados a fim de atingir o maior número possível de pessoas. E assegurar que cada produto tenha seu usuário muito claro”, completa Susy.

Vestidas para viver

“O Concurso Moda Inclusiva faz com que jovens estilistas lancem um novo olhar e soluções que facilitem o cotidiano da pessoa com deficiência. E permite que elas sejam as protagonistas da passarela e ganhem as ruas com elegância e estilo. Vestidas para viver”. Com essas palavras publicadas no site do evento, as organizadoras explicam qual é a ideia do projeto.

O concurso é realizado pela Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência e já está em sua sétima edição. De acordo com a organização, foi o primeiro projeto a contemplar esse segmento no Brasil e também é inédito no âmbito internacional.

As inscrições para a etapa local foram realizadas entre fevereiro e julho de 2015. Este ano, as cinco cidades que sediaram o concurso foram Araçatuba, Botucatu, São José dos Campos, Presidente Prudente e Bauru. De cada uma delas, foi escolhido um vencedor, que participará da etapa internacional em novembro, na cidade de São Paulo.

Um dos finalistas da edição do Concurso de Moda Inclusiva em Bauru foi Maicon Douglas, estudante de Design na FIB. Sua apresentação foi criada com base no tipo de escoliose em que a lesão ocorre acima da vértebra T9. “Comecei a ver que as meninas que usavam o colete de milwalkee eram tímidas, quase nunca tinham vontade de se socializar e, quando saíam, se vestiam com várias camadas de roupas pra esconder o aparelho. Vendo isso, decidi fazer do colete de milwalkee um acessório. Ao invés de escondê-lo, mostrá-lo”, comenta o estudante.

Maicon conta que, antes do concurso, não tinha consciência da importância da moda inclusiva. Com essa oportunidade, passou a perceber que a moda precisa ser universal. “Às vezes essas pessoas estão até ao nosso redor e sequer as notamos. Eu acho que é nisso que o concurso foca e tenta chamar atenção através da moda”, completa.

Os vestidos expostos na amostra Jardim de Sorrisos foram feitos pelos alunos da Universidade Sagrado Coração em parceria com a SORRI-BAURU utilizando materiais reciclados. [Foto: Moema Novais/Repórter Unesp]

Os vestidos expostos na amostra Jardim de Sorrisos foram feitos pelos alunos da Universidade Sagrado Coração (USC) em parceria com a SORRI-BAURU utilizando materiais reciclados
[Foto: Moema Novais/Repórter Unesp]

Anna Carolina Melo é estudante do curso de moda no Centro Universitário Moura Lacerda e participou da edição de 2014 do Concurso de Moda Inclusiva. “Todo o processo do concurso, desde o momento de pesquisa, onde o pensar moda vai muito além da estética, até o momento de criação e confecção da peça para chegar ao desfile foram extremamente enriquecedores”, relata. Anna não chegou às finais da etapa internacional do concurso, mas afirma: “minha maior vitória foi poder estar lá na final junto com outros 19 colegas de profissão que, de certo modo, pensam na moda da mesma forma que eu”.

Este ano, a estudante de moda optou por não participar do concurso, mas garante que em 2016 vai se inscrever novamente, uma vez que o tema tornou-se objeto de estudo de uma iniciação científica na faculdade. “A possibilidade de propiciar ao outro a sensação única de auto estima e vaidade ao poder vestir-se sozinho foi um dos meus maiores incentivadores. A partir daí, me vi diante de um mercado que ainda precisa de muito incentivo, principalmente de jovens que se interessam a pensar no outro além deles mesmos”, conta.

Anna ainda acredita que a importância de um concurso como este estaria em “incentivar os jovens designers e profissionais a questionarem certos padrões da moda e irem em busca de novas soluções que possam garantir a autonomia e confiança das pessoas com deficiência. Em suma, é mostrar que a moda também pode ser humanizada”.

Sorrisos e diversidade

Além de sediar uma das seletivas para o Concurso de Moda Inclusiva, Bauru também conta com a exposição Jardim de Sorrisos, uma parceria entre alunos do curso de Moda da Universidade do Sagrado Coração (USC) e da SORRI-Bauru.

Participaram da confecção das peças os alunos Beatriz Saes Macedo, Kaio Cesar da Silva Barbosa, Luciana Domingues Braz da Silva, Ana Lívia Rodrigues Ruiz, Jenniffer Letícia Falcão Rosa, Kananda Tatiele Moreira da Silva, Laura de Lima Jaime, Luana Factori, Lívia Mandolini de Oliveira, Marina Moreira Ferreira Ataliba, Victor Ferreira da Silva e Vitoria Domingues Tamassia. A exposição contou com a supervisão das cuidadoras da SORRI-Bauru, Ester Leite Araújo e Luciana Azevedo da Silva.

A exposição Jardim de Sorrisos é promovida pela SORRI-BAURU, Universidade Sagrado Coração e o Bauru Shopping. A amostra está no último piso do Bauru Shopping e vai até o dia 13/09. [Foto: Moema Novais/Repórter Unesp]

A exposição Jardim de Sorrisos é promovida pela SORRI-BAURU, Universidade Sagrado Coração e o Bauru Shopping. A amostra está no último piso do Bauru Shopping e vai até o dia 13/09
[Foto: Moema Novais/Repórter Unesp]

Kaio Cesar, estudante de Design de Moda na USC, conta que a ideia do Jardim de Sorrisos surgiu por meio do projeto InventaModa, coordenado pela professora Karla Alves. A proposta da exposição é exaltar a diversidade. “Queremos mostrar para a sociedade como a união entre pessoas, criatividade e amor podem mudar formas de ver o mundo e fazer arte. E conseguimos isso com a SORRI”, explica.

Segundo Kaio, a parceria com a SORRI-Bauru é realizada há dois anos. “O importante da exposição não é apenas os vestidos prontos e as pessoas comentando sobre, mas sim, a alegria que nos traz em fazê-los. São os sorrisos dos usuários da SORRI, ver as pessoas mudando a forma de pensar, ver meses de trabalho e amor ganhando realmente uma vida e mudando vidas. Isso é algo muito importante”, completa.

Thalita Guimarães é advogada e conta que, antes da exposição, só conhecia a moda inclusiva pela televisão. "Eu achei muito interessante. Se colocar em prática, em tecido, eu acharia muito bonito", conta.

Thalita Guimarães é advogada e conta que, antes da exposição, só conhecia a moda inclusiva pela televisão. “Eu achei muito interessante. Se colocar em prática, em tecido, eu acharia muito bonito”, conta [Foto: Moema Novais/Repórter Unesp]

A estudante Lívia Mandolini conta que o trabalho de equipe entre os alunos e os integrantes da SORRI foi realizado semanalmente durante o primeiro semestre de 2015: “os alunos entraram com a parte criativa e os usuários ajudaram na execução das ideias. Houve um grande comprometimento de ambas as partes, o que tornou possível a realização e o sucesso do projeto”.

A exposição ficará no terceiro piso do Bauru Shopping até dia 13 de setembro, com o funcionamento das 10h às 22h de segunda a sábado e das 11h às 22h aos domingos. A entrada é gratuita.

Reportagem: Giovanna Hespanhol
Produção Multimídia: Moema Novais
Edição: Isabela Romitelli

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