De acordo com o Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (CISA), o surgimento das bebidas alcoólicas se deu no período Neolítico da Pré-História, com o início da prática agrícola. Civilizações antigas de egípcios, gregos e romanos registraram seu consumo em canções, pinturas e lendas – o deus mitológico Baco é conhecido como o ‘Deus Vinho’.
Na Idade Média, a comercialização de cerveja e vinho aumentou, enfurecendo a Igreja que, como instituição, passou a considerar a embriaguez um ato pecaminoso. Durante o período da Renascença, tabernas e cabarés foram alvo de fiscalização massiva, com horários de funcionamento determinados para frear o uso excessivo do álcool.
Com as mudanças comportamentais proporcionadas pela Revolução Industrial e no início do século XX, o alcoolismo passou a ser considerado uma doença, e a regulamentação das bebidas alcoólicas se tornou uma realidade: A França instituiu a maioridade de 18 anos e os Estados Unidos implementou a Lei Seca, em 1920.
Políticas públicas e suas falhas
No Brasil, apenas em 2005 foi criada a “Câmara Especial de Políticas Públicas sobre o Álcool”. Até então, as discussões a respeito da substância e de seu consumo estavam inclusas nas políticas sobre drogas ilícitas e sem regulamentação para comércio.
Uma das políticas públicas em prática, no Brasil, para reduzir os danos e conscientizar a população sobre o álcool, além de campanhas informativas, é a proibição de sua venda para menores de 18 anos. Em 2015 foi sancionada a lei que categoriza a ação como crime.
A equipe de comunicação do CISA reforça que o consumo de bebidas alcoólicas por mulheres grávidas e adolescentes é inaceitável, porque “além do fato de ser ilegal, o uso de bebidas alcoólicas por menores de idade compromete o desenvolvimento do sistema nervoso central e expõe o indivíduo a situações de risco”. Ademais, as chances de se desenvolver uma dependência futura são maiores quando a experimentação ocorre precocemente.
Para a psicóloga Marina Cristina Zotesso, o uso descontrolado de álcool é uma questão de saúde pública, o que faz com que a verba utilizada para o cuidado de outras enfermidades diminua, “os gastos dispensados para o auxílio da doença [alcoolismo], bem como para situações agravantes que são consequências do uso, são cada vez maiores”, explica. Ela também reflete que a saúde familiar pode ficar abalada, uma vez que o alcoolismo se relaciona com casos de violência doméstica e negligência de menor.
Pelo fato do consumo de álcool fazer parte da cultura humana há milênios, existe pouca conscientização individual sobre o controle que esse hábito pode exercer na vida das pessoas. “Beber socialmente” é uma expressão comum mas que nem sempre significa uso moderado e, mesmo com a proibição, os jovens conseguem burlar as leis e bebem sempre que podem. “É importante frisar que nenhuma ação isolada ou a implementação de novas leis poderá resolver este sério problema enquanto a população também não se envolver e apoiar” ressalta a equipe do CISA, reforçando que é necessário uma nova forma de pensar de cada um e, então, de todos juntos: “somente um trabalho em conjunto, com governantes, pais, familiares, profissionais de saúde, academia, educadores, instituições privadas e a sociedade como um todo, será capaz de tornar as ações mais eficazes”.
Apesar da divulgação de informações e campanhas alertando sobre os malefícios causados pelo consumo excessivo de bebidas alcoólicas, as propagandas em meios midiáticos como a televisão e as revistas seguem vendendo um ideal de felicidade e comemoração atrelado a esse uso. A sociedade, num geral, ainda inclui a substância em comemorações, rituais e até mesmo acompanhando refeições, “dessa forma, acaba que se perde muitas vezes a noção sobre os prejuízos que altas doses podem causar ao organismo, bem como modificações imediatas na conduta comportamental do usuário”, afirma Zotesso.
Se dirigir alcoolizado, vai pagar multa!
Em 2008 foi promulgada a Lei Seca, como tentativa de diminuir acidentes de trânsito causados pelo consumo de álcool. No entanto, tal legislação foi muito criticada por possuir falhas, como quantidade mínima de concentração de álcool por litro de sangue, que permitiam ao motorista alcoolizado escapar das penalidades. Não atingindo esse mínimo, o crime não seria configurado.
Para corrigir os equívocos da lei anterior, no ano de 2012 foi sancionada uma nova versão que suprimiu a estipulação de quantidade mínima de substância detectável no sangue, e o modo de comprovação também foi alterado. O advogado Marcus Martins explica que “dentre as mudanças ocorridas, o condutor flagrado sob influência de álcool, pagará o dobro do valor da multa anterior. Antes a multa era de R$957,70 por dirigir embriagado, agora a multa é R$ 1.915,40, podendo chegar até R$ 3.830,80, em caso de reincidência no período de até 12 meses”.
Além das multas, o motorista que for pego com a capacidade psicomotora alterada pelo consumo de álcool pode sofrer detenção de 6 meses a 3 anos, e também perder a permissão temporária ou permanente para dirigir um veículo automotor. “Portanto, assumir o controle de um veículo em estado de embriaguez configura crime de embriaguez ao volante”, confirma Martins.
Programas de Recuperação e o Futuro da Política Nacional sobre o álcool
Sendo o alcoolismo uma doença crônica incurável, o governo federal, em 2009, lançou o Plano Emergencial de Ampliação do Acesso ao Tratamento e Prevenção de Álcool e outras Drogas, no qual incluiu serviços para os dependentes químicos na rede de atendimento do Sistema Único de Saúde (SUS). E ainda, no ano de 2011, essa assistência foi ampliada, permitindo o acesso à rede de atenção psicossocial para usuários de álcool e outras drogas.
Por fim, como vimos, o Brasil percorre uma longa e lenta trajetória no quesito políticas públicas relacionados ao álcool. Hoje, além das leis que se tornam mais rigorosas, o país adota medidas educativas para conscientização do consumo e programas que ajudam os dependentes em sua recuperação e reinserção. Porém, a falta de uma medida efetiva contra o uso abusivo e principalmente, uma fiscalização mais dura, o Brasil continuará com os dados elevados em relação ao consumo de bebidas alcoólicas, mesmo após a adoção da meta, estabelecida pela OMS, que o consumo nocivo fosse reduzido em 10% até 2025.
Reportagem: Yuri Ferreira
Produção Multimídia: Jhony Borges e Patrícia Konda
Editora: Karina Rofato