A luta constante pelo direito de estar nas ruas

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Brasileiros veem sua liberdade de expressão ameaçada devido à projetos de leis envolvendo protestos

Nas manifestações de 2013, milhões de pessoas saíram às ruas por reforma política. Desde então, os brasileiros frequentemente utilizam os protestos como um exercício legítimo de democracia. No Brasil, essa é uma garantia presente no artigo 5º da Constituição Federal. Nele estão elencados três direitos: o da  Liberdade de Expressão, de Reunião e de Associação.

Segundo a Constituição, é livre a manifestação de pensamento. Todos têm o direito de se reunirem pacificamente, para fins lícitos, sem armas e em locais públicos. Essa garantia independe de autorização, desde que não atrapalhe outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local. A única exigência é o aviso prévio à autoridade competente.

No entanto, no Brasil, ainda não há normas em relação ao uso de forças policiais em manifestações. E isso gera margem para que o Estado utilize seu poder de forma desproporcional e arbitrária contra os manifestantes. Foi o que aconteceu em 2013, um período marcado por repressão policial, no qual houve o uso de armamentos menos letais. Por conta disso, a Defensoria Pública do Estado de São Paulo moveu uma ação contra o Governo de São Paulo. E como resultado, em 2016, o governo foi condenado a pagar R$ 8 milhões em indenização por violência policial.

O papel do Estado

Em junho de 2017, o Movimento Passe Livre convocou um ato em São Paulo contra o aumento da tarifa do transporte público. A marcha nem havia começado quando a polícia lançou bombas de gás lacrimogêneo em direção aos manifestantes. A justificativa foi que eles não haviam informado oficialmente o itinerário que iriam seguir.

Esse, no entanto, não seria um motivo válido, como afirma a assistente jurídica do Centro de Referência Legal em Liberdade de Expressão e Acesso à Informação da ONG de direitos humanos ARTIGO19, Mariana Rielli. “A exigência de aviso prévio está prevista na Constituição. Mas o texto não fala em descrição de itinerário, já que o seu objetivo é apenas garantir a ciência das autoridades sobre o protesto”, explica. Ainda, segundo Rielli, pode haver diferentes interpretações, mas, independente disso, a polícia não pode reprimir uma manifestação que sequer começou. Ações como essa ferem o direito fundamental de reunião e expressão.

Dia nacional de Paralisação e Mobilização na Avenida Paulista (Foto: Bianca Moreira)

Já para o presidente da Comissão de Segurança Pública da OAB de Bauru, Alessandro Carrenho, o Estado procura agir como garantidor da democracia, assim como estipula a Constituição. “A polícia vem para representar o Estado democrático de direito, e além disso resguardar a integridade física desse núcleo”, afirma. Para ele, há um limite muito estreito entre força pública e abuso do poder público. “Muitas vezes há abuso realmente, por outro lado muitas coisas acontecem porque as pessoas que estavam ali não entendem que aquilo que está acontecendo é para a segurança deles”, analisa Carrenho. Segundo ele, é por isso que muitas vezes acontece a troca de violência, por parte dos policiais e dos manifestantes.

Leis que ameaçam as manifestações

A tensa relação entre a polícia e os manifestantes é algo comum em todo o país. Em decorrer disso, vários projetos de leis (PLs) sobre protestos foram criados e alguns deles podem colocar em risco o direito à liberdade de expressão, como expõe o infográfico abaixo.

O projeto de lei 508/2013 sobre vandalismo, por exemplo, considera que indivíduos podem ser condenados mesmo sem praticar violência. Só é necessário que estejam em “atos de vandalismo” com objetos que possam causar explosão, incêndio ou que sejam caracterizados como arma. A questão é como essas regras serão aplicadas em meio aos ânimos exaltados e durante possíveis embates.

“Todos esses projetos se interligam, já que as restrições ao direito de protesto partem de uma articulação que já se revelou de forma explícita em 2013, e que inclui os três poderes”, afirma Rielli. Segundo a advogada da ARTIGO19, esse movimento ficou mais evidente com a tramitação acelerada da Lei Antiterrorismo. Essa norma tem potencial para criminalizar movimentos sociais e manifestações. “É mais preocupante ainda quando se observa que, desde a aprovação, há diversos novos projetos que visam reinserir pontos preocupantes que ficaram de fora desta lei”, conclui.

Para Carrenho, no entanto, o problema seria eventuais prejuízos aos setores público e privado. “A partir do momento que o seu direito está atrapalhando ou está trazendo nocividade social, tem que ser analisado com rigor. É meu direito reivindicar, mas eu não tenho o direito de vandalizar”, afirma o advogado. Ele ressalta ainda que a aplicação da lei precisa ser criteriosa, para evitar que qualquer manifestação seja caracterizada como terrorismo.

Nos últimos cinco anos, 37 projetos de leis sobre protestos foram criados. “A ARTIGO19 tem monitorado a questão e há ao menos nove projetos com o claro viés de cercear a liberdade de expressão ao aproximar o protesto e as lutas dos movimentos sociais ao terrorismo”, relata Rielli. Todos esses PLs permitem o aumento da criminalização das manifestações e podem prejudicar o pleno exercício da democracia.

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Texto: Isaque Costa

Produção multimídia: Larissa Cavenaghi

Edição: Gabriella Soares

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