Vereadora Chiara defende a criação do Fundo de Preservação à Memória da Ferrovia e a volta do passeio de Maria Fumaça
No dia 30 de agosto, foram a leilão via internet pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) mais de 300 vagões em estado de sucateamento em Bauru. Os trens pertencem ao Governo Federal e estão sob concessão da Rumo Logística, antiga ALL (América Latina Logística), mas abandonados ao longo da linha férrea da cidade.
Do total, cerca de 30 vagões foram preservados pelo Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (CODEFAT) para o patrimônio cultural do estado, dez deles serão destinados ao município de Bauru e cinco para o Museu Ferroviário Regional. Baratinha, Pimentinha, Pão de Forma, Loba, Francesa e Minissaia estão entre as locomotivas cotadas para ficarem na gare da antiga Estação Ferroviária de Bauru.
Segundo o Diretor da Divisão Técnica do Museu, Alex Gimenez, a maioria dos vagões estavam com alto grau de desgaste. “O DNIT colocou para serem leiloados somente os que não tem valor histórico. Em Triagem [antigo pátio de manobras com oficina mecânica] os vagões estão colocados um em cima do outro. São cerca de 600 vagões que estão cotados para leilão. O que aconteceu foi que os vagões e locomotivas da região foram trazidos para Bauru e virou esse sucatão”, contou.
Ainda segundo Alex, conseguir preservar alguns carros é importante. “A preservação serve para você conseguir entender como funcionava, como foi feito e quais eram os critérios para a construção daquele bem. Também há o resgate sentimental com o público o que está ligado diretamente com a memória. As pessoas que frequentam aqui são muito saudosistas”, explica.
A gare da antiga Estação Ferroviária já abriga carros que foram tombados e reformados esteticamente. Porém, o roubo de peças fundamentais como turbinas elétricas e a inexistência da rede aérea de energia impedem que máquinas como a V8, Russa e Vandeca funcionem. Já a Maria Fumaça, de 1919, ainda é um bem rodante e Alex coloca lenha na caldeira periodicamente. Ela carrega o vagão que recebeu o presidente Getúlio Vargas em 1938, os vagões de passageiro de primeira e de segunda classe.
Histórico do Abandono
A situação crítica das ferrovias começou em 1996, após o Programa Nacional de Desestatização (PND) promovida pelo governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Devido à crise financeira, à dívida e ao déficit que vinham se arrastando desde a década de 1980, as privatizações poderiam ser uma solução para aumentar o investimento e conseguir recuperar e modernizar a malha ferroviária do país.
Segundo dados pertencentes ao DNIT, “De 1980 a 1992, os sistemas ferroviários pertencentes à Rede Ferroviária Federal S.A. – RFFSA e à FEPASA – Ferrovia Paulista S.A., foram afetados de forma dramática, quando os investimentos reduziram-se substancialmente, atingindo, na RFFSA em 1989, apenas 19% do valor aplicado na década de 1980. Em 1984, a RFFSA, encontrava-se impossibilitada de gerar recursos suficientes à cobertura dos serviços da dívida contraída”.
Segundo o Diretor do Sindicato dos Ferroviários de Bauru, Roque Ferreira, “Em 1996, quando ocorreram as privatizações da Rede Ferroviária Federal e da Paulista, havia dois contratos. As operadoras privadas assinaram para a utilização de bens operacionais e de patrimônio. Entre eles estavam as oficinas, os prédios, vagões e máquinas. Dentro desse contrato de concessão, elas tinham uma obrigação: a de devolver para a União aquilo que receberam [de maneira] igual ou melhor”, explicou.
Dentre as empresas que ganharam a concessão da malha paulista e oeste estavam a Ferroban (Ferrovia Bandeirantes) e a Ferrovia Novoeste S.A. (Estrada de Ferro Noroeste do Brasil), as quais cruzavam por Bauru. Em 2006, ambas as empresas foram compradas pela América Latina Logística (ALL). Já em 2016, a Rumo Logística e a ALL se fundem. A concessão começou em 1998, possui duração de 30 anos e está prevista para vencer no final deste ano.
Ainda segundo Roque, durante esse tempo não aconteceu o desenvolvimento esperado. “Em todo esse período houve pouca fiscalização sobre esse patrimônio. As operadoras privadas como esse material não eram delas, principalmente os vagões, eles sofriam acidentes, chegavam em um nível de desgaste que elas simplesmente iam encostando. Esses vagões não tem mais utilidade nenhuma. Hoje é praticamente impossível utilizá-los e uma reforma neles custaria uma fortuna”, explicou.
Dificuldades de Investimento
Segundo dados obtidos pela Secretaria de Economia e Finanças de Bauru, o município conta com um orçamento de R$14.215 milhões destinados à Cultura e ao Patrimônio Histórico em 2018. Deste total, cerca de R$12.765 milhões são recursos próprios do município, cerca de R$200 mil são provindos do estado e R$1.250 milhão são do âmbito federal. Os fundos destinados ao investimento são de apenas R$118.170 mil.
Sobre o leilão dos vagões, a Diretoria de Infraestrutura Ferroviária do DNIT informou que o que ocorreu em 2015, cerca de 75 vagões foram arrematados por uma única pessoa física. O valor total da venda foi de R$85.300 mil, os quais foram destinados à União Federal. Já o de agosto de 2018 não houve interessados. Segundo a diretoria, “Os bens não foram concedidos ao município pois já estavam previstos para leilão. Geralmente, quem compra este tipo de material são siderúrgicas com a finalidade de aproveitarem a matéria prima”, informou.
Passeio de Maria Fumaça
A vereadora Chiara Ranieri juntamente com a Secretaria Municipal de Cultura estão com um novo Projeto Turístico Cultural que prevê um passeio de trem. O passeio teria saída de um dos shoppings, passando pela antiga Estação Paulista, onde estariam dois museus, e com término na Estação Ferroviária. Segundo informado pela assessoria, Chiara acredita que “além de manter viva a memória da ferrovia na cidade, o passeio tem o objetivo de contribuir para parte da revitalização do Centro, onde a Estação Ferroviária está localizada”.
No entanto, para que isso possa acontecer, seria necessário um investimento de cerca de R$1,5 milhão que, segundo o Secretário de Cultura, Luiz Fonseca, em entrevista para a TV Câmara, foi solicitado ao Fundo de Interesses Difusos (FID). A empresa detentora da concessão da malha ferroviária, a Rumo, também precisa autorizar e fazer a manutenção da linha férrea ao longo do trecho.
O passeio de Maria Fumaça já era uma realidade em Bauru, o trajeto original tinha saída da Estação Ferroviária e com chegada até a Estação Paulista, apenas. Porém, em 2013, após um acidente com um trem que descarrilou no trecho de São José do Rio Preto e matou oito pessoas, o passeio em Bauru foi suspenso. O motivo seria por ambos os trechos serem administrados pela mesma concessionária, a ALL na época.
O secretário da Cultura, Luiz Fonseca, foi procurado pela redação, mas não houve retorno até o fechamento da edição. A empresa Rumo Logística também foi procurada, mas não houve resposta.
Texto e fotos: Heloísa Manduca
Produção Multimídia: Nádia Linhares
Edição: Caroline Cardillo
One thought on “Vagões de trens sucateados em Bauru vão a leilão”