Homens de 44 anos com baixa escolaridade, problemas na coluna e acima do peso: este é o perfil dos caminhoneiros do Brasil, de acordo com os dados divulgados em 2016 pela Confederação Nacional dos Transportes (CNT)
A análise, que foi baseada em entrevistas com 1.066 profissionais, mostrou que 99,8% dos motoristas são homens, sendo 729 autônomos e 337 contratados para fretes. Dos profissionais sem chefes, cerca de 40% tem o ensino fundamental incompleto e mais de 25% dos empregados registrados têm o ensino médio completo.
Rodando cerca de 10 mil quilômetros por mês, ou aproximadamente 11,3 horas por dia, os caminhoneiros do Brasil ganham em média R$ 3.800 reais, descontando impostos, combustível e a manutenção do veículo, por exemplo. Quase metade destes profissionais estão endividados e acreditam que os saldos negativos são decorrentes da crise econômica nacional e internacional – incluindo o aumento do combustível.
Este é o caso do caminhoneiro contratado Joseval Lima da Silva, que afirma que a precarização da profissão está relacionada ao encarecimento do diesel. “O combustível aumenta duas vezes na semana, às vezes de 15 em 15 dias”, afirma. Segundo o profissional de transporte, o Governo atual tem sua parcela de culpa na alta dos preços. “Ele (o Estado) ficou de botar a tabela até dezembro e não cumpriu a palavra. Quem está levando a pior disso tudo são os donos de um ou dois caminhões, que não aguentam pagar o diesel”, conclui.
No dia 31 de agosto foi anunciado o aumento de 13% no preço do combustível. A alteração do custo refletiu na tabela de frete, que precisa ser reformulada toda vez que o diesel variar mais do que 10%, conforme a lei 13.713.
A polêmica da tabela
No dia 9 de agosto foi aprovado pelo presidente Michel Temer a lei que determina valores mínimos de fretes para transportes rodoviários no país. A tabela de frete foi uma das principais reivindicações exigidas pelos caminhoneiros durante a greve que durou dez dias e parou o Brasil.
Acatando o pedido da classe trabalhadora, o presidente Temer se manifestou, por meio da Advocacia Geral da União (AGU) e apoiou o tabelamento, afirmando que a medida garante o pagamento adequado pelos transportes das cargas. Para o órgão, antes da decisão do Estado, os preços eram muito abaixo dos custos e não cobriam todos as despesas da viagem.
O caminhoneiro José Martin dos Santos Filho apoia a nova lei e defende o ponto de vista de sua classe trabalhadora, afirmando que “a tabela de frete, segundo os meus colegas autônomos, melhorou bastante [a situação financeira dos caminhoneiros], já que ela tem um preço mínimo para trabalhar. Antes, as empresas ofereciam o frete lá embaixo”, explica.
Quem não ficou muito feliz com a nova legislação foi o setor industrial e o agronegócio brasileiro. Para os representantes das empresas nacionais, a medida reflete no aumento dos preços de produtos básicos e, consequentemente, na alta da inflação. O embate com a livre concorrência também foi outro ponto citado pelos manifestantes contrários à tabela de frete.
De acordo com um estudo divulgado pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), a tabela de fretes vai contribuir para o aumento de 12,1% nos preços de alimentos como frutas, legumes, arroz e carnes.
O gerente de marketing da Clamel, Eduardo Mancioppi Clamel, explicou que, além de prejudicar a produtividade das empresas, a nova medida vai afetar diretamente a economia do país: “o tabelamento de fretes determinado pelo governo e agora convertido na Lei nº 13.703/2018 manterá um valor mínimo para o transporte de cargas país afora e beneficiará os caminhoneiros do Brasil. Porém, [a intervenção] pode resultar no efeito oposto, afetando a produtividade, os preços dos produtos para o consumidor final e, por consequência, a economia”, conclui.
Caminhoneiros do Brasil
Perigosa, desgastante e solitária. Esses são os pontos negativos da profissão que mais apareceram na entrevista liberada pelo CNT, em 2016. Além de se manterem com uma renda baixa, os caminhoneiros sofrem com a quantidade de horas na frente dos volantes e com a precarização do emprego.
Longe de casa, os profissionais são obrigados a dormir nas boleias dos caminhões ou nos pátios das indústrias contratantes; são induzidos a ingerir substâncias ilegais para se manterem acordados e não recebem proteção social.
Para os caminhoneiros autônomos a situação piora, já que exercem as mesmas atividades dos registrados mas têm seus direitos negados pela constituição brasileira. Para falar mais sobre o assunto, o Repórter Unesp conversou com vários caminhoneiros autônomos e contratados, que revelaram as vantagens e desvantagens da profissão, além das opiniões a respeito da tabela de frete. Confira!
Número de transportadoras diminui
As transportadoras também acompanharam o encolhimento neste período, já que reduziram de 156.765 para 111.743, conforme aponta a CNT. Para o Supervisor de Custos e Estudos Econômicos da Transportadora Risso, Tiago Augusto Melloni, a falência das empresas pode estar relacionada com a falta de gerenciamento. “O excesso de firmas no mercado traz o problema da concorrência desleal. Muitas delas têm dificuldade de mensurar os custos da operação e não conseguem dar o preço adequado do frete para o cliente. Estas empresas acabam praticando preços muito abaixo de seus custos, refletindo diretamente na rentabilidade do negócio”, explica.
Em média, os gastos das transportadoras são baseados nos custos fixos e variáveis. “Os custos fixos são gastos que independente do veículo rodar, o veículo vai ter. Já os custos variáveis representam os gastos que ocorrem de acordo com a rodagem do veículo”, informa o supervisor. Os salários dos motoristas, o IPVA e os monitoramentos, por exemplo, são dívidas previstas pelas empresas, enquanto que o combustível, a manutenção dos caminhões e as recauchutagens entram para as contas variáveis.
A gerente da transportadora Risso, Luciana Cristina Luz, explica que os pedágios caros também contribuem para a crise no setor dos transportes: “a nossa margem de lucro é bem reduzida por causa dos pedágios, combustíveis e da mão de obra, que não é muito barata”, afirma.
Como saída para a falta dos repasses dos gastos ao cliente, Tiago acredita que a supervisão dos custos pode equilibrar o caixa das transportadoras, já que a maioria das empresas não vistoriam os custos e as despesas e acabam entrando no vermelho.
Repórter: Adriele Silva
Produção Multimídia: Julia Mendonça
Edição: Danilo Mendes
Foto de capa: Getty Images