“Se não preso, o que é?”: como sistema punitivo apresenta alternativas

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Em um país com déficit de mais de 300 mil vagas nas penitenciárias, é necessário repensar o modelo prisional vigente

Junto aos seus parceiros de continente México e Colômbia, o Brasil tem uma das mais altas taxas de homicídios do mundo. Em 2016, atingiu-se a marca histórica de 62.517 registros do crime, superando o patamar de 30 ocorrências por 100 mil habitantes. Os estados com maiores incidências são o Acre, Tocantins, Bahia, Maranhão, Rio Grande do Norte, Ceará e Sergipe – todos pertencentes às regiões Norte ou Nordeste. Entretanto, a maior população carcerária brasileira se concentra no Sudeste –mais precisamente no estado de São Paulo – são 174 mil presos e presas segundo pesquisa feita em 2018 pelo IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). Esse quadro demonstra como o sistema punitivo no Brasil apela para o encarceramento. 

A situação carcerária do país é complicada, mas necessária, como explica o professor doutor da Instituição Toledo de Ensino (ITE) de Bauru-SP Cláudio Amaral Bahia: “Embora o Supremo Tribunal Federal tenha reconhecido a situação caótica vivenciada pelo sistema prisional brasileiro, a sua manutenção se faz necessária.” O especialista acrescenta que “é preciso em casos graves e de reiterada reincidência, proceder ao recolhimento do agente infrator, protegendo a sociedade de sua atuação contrária à paz e à segurança social”. Os números da população carcerária beiram os 720 mil, revelando um aumento de 270% na última década. Quanto à população carcerária feminina, o número assusta ainda mais: o aumento foi de 656%, segundo dados do IPEA de 2018.

Problemáticas do encarceramento em massa

De acordo com os dados do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), a incidência do vírus da AIDS é 138 vezes maior entre a massa carcerária do que a constatada na população em um geral. Pelo mesmo levantamento, também foi comprovado que pessoas privadas de liberdade têm quatro vezes mais chances de cometer suicídio do que o restante do Brasil. Além disso, 88% dos presos não estão envolvidos em qualquer iniciativa educacional, como ensino escolar e atividades complementares. 

O processo sadio de ressocialização depende de uma discussão sobre a penalidade no contexto social, levando em conta os direitos humanos. Amaral explica que não existe “fórmula mágica”: “A criminalidade não diz respeito apenas ao endurecimento das leis. Esse é apenas um passo que necessariamente deve ser acompanhado por uma melhora no acesso democrático à educação, saúde, cultura e trabalho de qualidade, a fim de que as oportunidades de interação social imprimam no consciente que o crime não compensa, independente da classe social, econômica ou cultural”, revela o especialista.

Cerca de 40% da população privada de liberdade são presos provisórios, ou seja, não possuem condenação judicial. Isso corresponde a cerca de 400 mil pessoas em regime fechado, sem qualquer sentença estabelecida. Mais de 50% dessa população são de jovens de 18 a 29 anos e 64% são negros. Dos que já foram julgados, 38% estão em regime fechado e 15% em semiaberto (dados CNPM 2018).

Possíveis alternativas

Diante da crise de superlotação e precariedade, são procurados novos modos de aplicação da condenação. De acordo com o artigo 44º do Código Penal, as penas alternativas podem substituir a prisão clássica se a sentença for menor do que quatro anos, e o crime pelo qual o réu foi condenado não for violento ou de grave ameaça. São elas a prestação pecuniária (pagamento em dinheiro à vítima), perda de bens e valores (confisco de capital do condenado, que é convertido para o Fundo Penitenciário Nacional), prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, interdição temporária de direitos (impedimento da pessoa condenada de exercer qualquer função, cargo ou atividade pública) e limitação do fim de semana (impõe à pessoa condenada a obrigatoriedade de permanecer, durante os sábados e domingo, ao menos cinco horas diárias em casa).

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Das alternativas que substituem o método convencional do sistema punitivo, Pedro Rivellino, estudante de direito da Universidade de São Paulo (USP) e membro da AMPARAR (Associação de Amigos e Familiares de Presos/as) da capital paulista, acredita que as práticas restaurativas comunitárias são a melhor saída, “porque elas têm o entendimento do conflito como algo permeado pelas violências sociais. Além disso, elas são centradas na vítima, ou seja, têm o objetivo de resolver os conflitos, e não mascarar questões de classe na construção de sujeitos passíveis de serem torturados – como faz o aprisionamento”.

Cláudio Amaral Bahia também enxerga a vantagem na aplicação das penas alternativas e na ampliação da ressocialização da pessoa. Isso é possível por meio de uma conscientização da conduta errônea cometida a partir da prestação de auxílio à comunidade: “alguém que é surpreendido dirigindo sob efeito de álcool poderá ter sua habilitação suspensa, bem como estará passível de ser condenado a prestação de serviços em hospitais que tratam da reabilitação de vítimas de acidentes de trânsito. É possível que o convívio com os nefastos efeitos da imprudência faça com que o infrator reflita e chegue à conclusão de que álcool e direção não se misturam. Assim, não se repete mais a referida conduta”.

Para acompanhar mais detalhes sobre essa cobertura, leia o texto sobre a questão do encarceramento feminino no Brasil.

Repórter: Nathália Cunha

Produtora Multimídia: Aline Campanhã

Editor: Rafael de Toledo

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