O trabalho é talvez o único fator que faça os membros de uma sociedade semelhantes entre sí. Ao mesmo tempo que é um tema abrangente, possui diversas ramificações e debates. Por um lado no sistema capitalista somos igualmente condicionados a trabalhar. Por outro, a variedade de funções, remunerações e condições é infinita e heterogênea.
É com isso que a 56ª edição do Repórter Unesp trabalha. Visualizando o trabalho pelo viés da cidade, do campo e das burocracias envolvidas que a equipe de jornalistas trabalhou no mês de maio para entregar a webrevista.
O texto de capa da revista traz uma visita histórica ao trabalho em terras brasileiras. Em alguns momentos é meio raso, mas elucida o leitor sobre como chegamos até esse momento. Peca apenas em não apresentar alguns conceitos e debates que serão tratados no decorrer das matérias.
Análise Geral
Foram levados em consideração elementos como a abordagem, temática, gramática e relevância das matérias. Tanto para a revista quanto para a sociedade em si.
No geral, a edição cumpre seu compromisso com a temática. Entrega diversas reportagens completas com ótimos personagens por muitas vezes apagados da realidade brasileira. Dessa forma, o leitor aprende, reflete e consome um jornalismo de qualidade.
Porém, a revista não tem muito equilíbrio. Ao mesmo tempo que existem matérias aprofundadas com diversas fontes algumas não fogem das abordagens padrão e nem entregam elementos novos para a discussão. Se perde em algumas partes burocráticas e em determinados momentos sofre com linguagens técnicas, sejam jurídicas ou econômicas. O que, é claro, não prejudica o desempenho da equipe.
A falta de equilíbrio reaparece nos produtos multimídia. Poucas matérias possuem vídeos. Apenas uma apresenta um podcast com uma estrutura organizada e algumas matérias possuem apenas fotos. Possui um caso de reportagem apenas com texto, o que é muito prejudicial para um produto de jornalismo digital. Além disso, apenas duas reportagens possuem fotos autorais. Outro elemento negativo é que em todas as matérias, com exceção de uma, os hyperlinks abrem na mesma aba. Isso prejudica o andamento da leitura visto que a matéria se perde ao abrir um link.
Apesar disso, os infográficos são muito bem produzidos e didáticos. Os vídeos são bem editados e em sua maioria complementam as informações do texto. As fotos escolhidas, mesmo que de banco de imagem, complementam a narrativa, juntamente com as entrevistas em áudio.
Quais áreas do trabalho são pautadas?
Acredito que a ilha que trata sobre as relações trabalhistas deveria ser o ponto de partida da narrativa da revista. Porém, a escolha de abordar primeiro a cidade não foi tão ruim.
Somos introduzidos na ilha de trabalho na cidade com uma bela reportagem sobre a relação dos imigrantes com o trabalho no Brasil. Trazendo pessoas que viveram na pele a vida em uma cultura diferente e analisando dados importantíssimos para o tema.
Após essa reportagem, oscila no aprofundamento. Aborda a questão dos idosos e mulheres motoristas com uma abordagem mais rasa e clichê. ganha mais força com as reportagens sobre o trabalho para deficientes auditivos e transexuais.
A escolha de inserir a reportagem especial nessa ilha foi certeira. A reportagem é boa, possui ótimas fontes e boa redação. Porém, por ser a reportagem especial, poderia ter sido mais aprofundada. Promete debater a questão da regulamentação da profissão, porém deixa esse viés na mão de praticamente uma fonte. A prostituta que é entrevistada poderia ter sido indagada sobre a questão, por exemplo.
A ilha apesar de cumprir com o nome cidades, tem um viés mais visível que é o de abordar minorias. Surdos, idosos, imigrantes, transexuais, prostitutas e mulheres são os temas principais das discussões. A temática da cidade é encerrada com um artigo de opinião que não possui muitas opiniões. Em alguns momentos parece um tira-dúvidas sobre estágios.
Seguimos trabalhando
As relações trabalhistas começam a ser tratadas no meio da revista. Novamente a ilha começa bem. A reportagem sobre a reforma trabalhista é um dos destaques da edição, trazendo de forma extremamente didática as mudanças ocorridas nos últimos anos.
A revista segue forte com a reportagem/podcast sobre o movimento sindical no Brasil e em Bauru. Diferente dos outros produtos de áudio da revista, este possui identidade própria e uma estrutura organizada. Dessa forma, traz algo inovador para o Repórter Unesp e oferece ao leitor um bate papo informativo muito didático e com ótimas fontes.
Diminui o ritmo com uma reportagem grande sobre a reforma da previdência. O tema que é complexo e está em destaque no Brasil é aprofundado em alguns pontos e deixado à margem em outros. Posteriormente, a reportagem sobre a questão do trabalho feminino é ponto fraco da revista. Não possui imagens, vídeos, podcasts e as fontes apresentam opiniões rasas sobre o assunto. Sequer possui uma imagem de destaque.
Fechando a ilha, mais um artigo, este com um viés ideológico forte, mas que complementa a discussão.
No campo o fim
A edição é finalizada abordando o trabalho no campo. Função essa que é primordial no Brasil, tendo em vista que somos um país economicamente muito dependente do agronegócio.
A ilha tem um viés denunciativo grande. Começa abordando o trabalho infantil, e passa por outras situações degradantes como condições de escravidão e o trabalho informal.
Possui ótimas fontes e suas reportagens mais uma vez se destacam pelo aprofundamento dado. O viés é quebrado com a reportagem sobre agricultura familiar, que é uma das únicas da edição que possuem fotos autorais. O tema é tratado com leveza e com muitas informações.
No final, o saldo é positivo, visto que os produtos multimídia e os textos profundos trazem excelentes reportagens para o Repórter Unesp, debatendo assuntos importantes, atuais e que afetam diretamente todos na sociedade.