Família sem fronteira perante a era da globalização

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Atualmente, muito ouve-se falar em pessoas que deixam seu país de origem para estudar ou trabalhar e, ao mesmo tempo, ter a oportunidade de aprender uma nova língua. Tal experiência cultural pode ser mais enriquecedora quando se tem contato direto com uma família de outro país.  A prática do intercâmbio é um dos recursos do mundo globalizado. Este, por sua vez, permite uma estreita relação entre as diversas regiões do globo e, consequentemente, o fluxo migratório de pessoas de um lugar para o outro em questão de algumas poucas horas.

No entanto, não é tarefa simples deixar a zona de conforto do país em que se nasce, onde já tem-se estabelecida uma cultura, costumes, comidas, crenças e língua materna, para, enfrentar um mundo completamente obscuro e, na maioria das vezes, sem conhecer ninguém. Para tanto, surgiu uma prática na qual pessoas que buscam ajudar o próximo e que estão dispostas a trocar experiências culturais abrem suas casas para receber esses estrangeiros que “caem de paraquedas” em outro país.

Assim, esse tipo de intercâmbio funciona como a aquisição de uma espécie de lar temporário. Essa família sem fronteira possibilita que o intercambista seja abrigado como um membro da casa, não como uma visita. Dessa forma, ele é recebido com todos os direitos básicos para sua permanência no local. É como se fosse um filho que tem seu próprio espaço onde possa dormir, estudar e ter sua privacidade. Porém, ele também assume as responsabilidades e os deveres da casa, seguindo as regras impostas pela família que o abriga e contribuindo com as tarefas do cotidiano. Atividades estas como a limpeza dos cômodos, a lavagem das roupas, o preparo das refeições, dentre outras.

Vantagens em fazer parte de uma família sem fronteira

Deste modo, pode-se observar que existem uma série de vantagens tanto para quem realiza o intercâmbio familiar, quanto para quem agrega um estrangeiro. A principal delas é a troca mútua de experiências, pois, ao estabelecer contato com uma pessoa de uma cultura tão distinta, é possível aprender muito com ela. Na mesma proporção em que se aprende, ela também será ensinada sobre a cultura do país.

Outro ponto positivo que pode ser identificado nessa relação é a criação de um vínculo familiar, já que o intercambista acaba fazendo parte da dinâmica da casa. Isso se deve ao fato de ele participar de todas as atividades de costume daquela família, acabando por estabelecer laços com essas pessoas. Mesmo porque, esses novos amigos acabam sendo os primeiros com quem ele teve contato no país. Assim, aos poucos, esse convívio vai constituindo um novo arranjo familiar. Ou seja, inicialmente, uma pessoa desconhecida, vinda de outro país e que, muitas vezes, não compartilha nem a mesma língua, torna-se um membro igualmente importante aos demais. É como se houvesse um parentesco sanguíneo, mesmo que seja apenas por consideração.

A experiência de uma família sem fronteira na América do Sul

A estudante brasileira Bianca Yuka Suzuki, 21, conta como foi a experiência durante seu intercâmbio voluntário em ONGs na Argentina. “Eu senti como se estivesse na casa dos meus pais. A própria mulher pedia que eu a chamasse de mama Marta, e que eu, com a mesma idade de sua caçula, era como uma filha”. Bianca ficou por 3 semanas na casa de um casal de meia idade, dos quais os filhos são todos adultos e moram fora da cidade. Ela relata que os dois, ambos professores universitários, se sentiam muito sozinhos depois da partida dos filhos. Assim, acabaram optando por acolher intercambistas na tentativa de terem companhia, ao mesmo tempo em que pudessem aprender novos elementos culturais. “Eu era a substituta de uma filha cujos pais sentiam muita saudade, e isso era super aparente”, afirma Bianca.

Intercambista, Bianca Suziki, conta sua experiência em participar de uma família sem fronteira

(Arte: Laura Kerche/Repórter Unesp)

Bianca acrescenta que aprendeu muito com o casal, principalmente em relação ao castelhano. Tal língua estava sendo estudada por ela há pouco tempo, não apresentando total domínio. A estudante conta que pôde aumentar seu vocabulário, além de melhorar sua pronúncia. Fato este que deve- se à família ser muito acolhedora e interessada em ajudá-la, reservando um bom tempo após as refeições para conversar com ela.

O que pode ser agregado na relação com uma família sem fronteira?

Quando questionada sobre o que ela poderia ter acrescentado na vida do casal, Bianca diz ter sido a troca de culturas. Isso porque a família sempre fez questão de apresenta-la às comidas típicas e aos hábitos do país, como o “la siesta”, por exemplo. Tal prática consiste na interrupção das atividades das 12h às 17h. A finalidade desse “break” é fazer com que os cidadãos possam almoçar com suas famílias e descansar para retornar ao trabalho até as 21h. Dessa forma, a estudante quis retribuir o interesse, também ensinando a eles alguns costumes do Brasil. A exemplo dessa cultura, tem-se as comidas típicas, como o brigadeiro, o qual o casal ainda não havia experimentado.

Depoimento de Bianca Suzuki

(Arte: Laura Kerche/Repórter Unesp)

Casos de família

Assim como em famílias tradicionais podem haver desavenças, as diferenças culturais também podem causar embates em uma experiência de família sem fronteira. Joana Aquino, 19, hospedou, juntamente com sua família, um intercambista indiano de 16 anos em sua casa por 4 meses. 

A estudante afirma: “ele não era muito de conversar e não parecia muito interessado em aprender a língua portuguesa. Mas parece que gostou do tempero aqui de casa, ele comia bastante”. Sobre as desavenças ela conta: “ele passava a madrugada gritando enquanto jogava, confesso que um dia eu desliguei a internet, pois precisava acordar cedo e já eram 2:00 da manhã”.

Quando questionada sobre o que ambas as partes aprenderam durante essa experiência Joana diz: “Além de umas coisas tradicionais da Índia e mais sobre o país, aprendemos que o Brasil tem uma reputação que eu considero meio ruim, principalmente entre os jovens de outro país. Uma reputação conhecida como o passaporte deles pra liberdade. Ele aprendeu que o Brasil não é só ‘oba oba’ como diria meu pai”.

A família no mundo globalizado

No atual contexto, compreende-se que a família despiu-se de sua posição institucional para assumir um conceito mais abstrato, quase que poético, em relação aos laços que são estabelecidos entre seus membros. Assim, para compartilhar uma rotina sob o mesmo teto, não basta ter parentesco sanguíneo e, tampouco, duas pessoas de sexos opostos criando os filhos. Logo, o que é necessário, de fato, para que essa convivência tenha futuro concentra-se em um plano mais simples, o dos sentimentos. Tais sentimentos não requerem regras impostas pela sociedade, pois, desde que sejam positivos, tornam-se suficientes para constituir aquilo que se compreende por família, incluindo as famílias sem fronteiras.

Repórter: Thainá Araujo Lomba
Produtor de Mídia: Laura Lima Kerche
Editor: Fellipe de Souza Gualberto Leite

Você acha que saberia dizer qual o tamanho das famílias brasileiras?

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