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Medidas do governo Temer desagradam MST e outros movimentos pela reforma agrária

Reivindicações antigas do MST e seus integrantes sofrem com reformas impopulares

MST participou da Greve Geral de 28 de abril

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) esteve presente na Greve Geral do dia 28 de abril.  (Ana Flávia Cézar/Repórter Unesp)

Um passado de capitanias hereditárias, com percurso por grandes ciclos exploradores como café e açúcar nas mãos do coronelismo, levaram a estrutura fundiária brasileira a ser bastante desigual. De acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento Agrário, cujo último levantamento foi publicado em 2011, 42% do total de terras está contido em menos de 1% dos imóveis brasileiros.

Diante deste cenário, grupos de trabalhadores rurais entendem a situação como desigual, fruto de um contexto elitizado. Amparados pela Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, que garante o direito à moradia, uma verdadeira “sopa de letrinhas” de movimentos sociais, como MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) e a FNL (Frente Nacional de Luta Campo e Cidade) reivindicam o acesso às terras improdutivas. 

Apesar dos movimentos serem apoiados pelos direitos universais, a reforma agrária é um tópico complexo. A dinâmica de repassar terras desocupadas para famílias do MST é dificultosa, afinal, o poder público precisa incentivar o cadastro de imóveis no Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) para que políticas públicas sejam estruturadas visando a reforma. 

MST participou da Greve Geral de 28 de abril

A Confederação Nacional dos Agricultores Familiares e Empreendedores Rurais (CONAFER) apoia o Acampamento Sem Limites em Bauru. (Ana Flávia Cézar/Repórter Unesp)

As dificuldades da reforma agrária vão além da obtenção das terras pelas famílias. O Secretário de Agricultura de Bauru, Chico Maia, afirma que o poder público trabalha com os movimentos que batalham pela terra e que há outro problema que precisa ser enfrentado. “Como secretário, posso enxergar as demandas dos movimento sociais de luta pela terra e, já estando nela, precisamos lutar pela permanência. Trabalhamos com duas frentes: favorecer a permanência e o desenvolvimento dos assentamentos”, diz. 

Willian Cabeçoni, Dirigente Regional do MST, explica que os obstáculos enfrentados pelo grupo não surgiram agora. “As dificuldades não vêm de hoje com o governo de Michel Temer: já há um tempo as dificuldades são arrecadação de terra e melhorias na infraestrutura para os assentados. No último governo já avançamos na infraestrutura, mas na conquista de terra não avançamos”, fala. De acordo com dados de 2010 do Incra, 43% das famílias nos assentamentos possuem energia elétrica sem interrupção e apenas 1,14% contam com rede de esgoto.  

Dificuldades na luta do MST

Recentemente, militantes do MST foram assassinados no Mato Grosso e em Minas Gerais. Silvio Estevo, representante do Acampamento Sem Limites de Bauru e da FNL, enxerga com preocupação o atual momento. “Estamos completamente desprovidos da segurança pública e isso nos preocupa. Nesse momento, os políticos se preocupam com eles próprios e nos deixam afastados desse direito à segurança. Se houvesse intervenção do ministério público junto ao Incra, não teríamos esta baixa dos nossos companheiros”, declara Estevo. 

O atual contexto de reformas impopulares, como a Reforma Trabalhista e a Reforma da Previdência, aflora a insatisfação do trabalhador rural, devido ao longo tempo de contribuição exigido para a aposentadoria. “O trabalhador do campo tem um desgaste muito maior do que o da cidade. Hoje, principalmente a trabalhadora rural: com o aumento de tempo de trabalho, talvez ela e sua família não consigam aproveitar o benefício por causa do desgaste físico”, avalia Willian Cabeçoni, Dirigente Regional do MST.

Para o secretário Maia, há outras dificuldades na organização dos próprios movimentos. “A reforma começa a dar errado quando [as famílias] saem dos acampamentos e vão para os assentamentos. Quando estão no acampamento, há comissões e mobilizações organizadas; já nos assentamentos, são propriedades muito grandes, são em torno de 400 a 500 famílias que mal se conhecem e se distanciam de lutas coletivas”, conclui. 

MST participou da Greve Geral de 28 de abril

Acampamento Sem Limites Bauru, apoiado pelo CONAFER, também esteve presente na Greve Geral. (Ana Flávia Cézar/Repórter Unesp)

Desilusões políticas

Márcia Motta, professora da Universidade Federal Fluminense e pesquisadora da questão agrária do Brasil, aponta resistência às negociações no governo Temer. “É difícil negociar com um governo que fere as bases da sociedade democrática. Além disso, a criminalização dos movimentos sociais presente na mídia e nos discursos governamentais dificultam ainda mais a mobilização de um movimento que coloca em xeque as bases de sustentação do Estado brasileiro: a grande propriedade e o agronegócio”, comenta.

As dificuldades da identificação política vão além disso para os trabalhadores rurais. “Como o movimento sempre foi identificado com a esquerda, ele sofre o efeito do atrelamento entre esquerda e corrupção; como se ela fosse algo restrito a um determinado perfil político”, analisa Márcia. 

MST participou da Greve Geral de 28 de abril

Participante do Acampamento Sem Limites carrega faixa em oposição às reformas do Governo atual. (Ana Flávia Cézar/Repórter Unesp)

Já para Secretário de Agricultura de Bauru, Chico Maia, a reforma agrária vai além das ideologias pois, segundo ele, “não é coisa de comunista, é questão capitalista: são pequenas propriedades individuais, não coletivas”. Maia também aponta inconsistências em alguns grupos que lutam pela redistribuição de terras. “Precisa ser bastante organizado, um conjunto que luta só pela terra, porque infelizmente algumas lideranças cobram mensalidade dos acampados e vivem disso. Portanto, há interesse que não haja a reforma e, sim, a manutenção dos assentados nas terras”, alega. 

O secretário também é crítico de Temer. Em dezembro, o presidente aprovou uma medida provisória que exige a titulação de imóveis assentados através do Incra. “A medida deve acelerar o processo de reconcentração da propriedade no Brasil. Famílias sem assistência e necessidades básicas ficam à espera do Incra fazer a titulação dessas terras”, critica.  

 

Reportagem: Guilherme Sette

Produção Multimídia: Ana Flávia Cézar

Edição: Heloísa Scognamiglio 

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