Em sua definição, o termo homossexual pode referir-se a qualquer indivíduo que sente atração sexual e ou afetiva por outros do mesmo sexo. Porém, levando em conta outras características sociais, aos poucos, ao ouvir a palavra “homossexual” a associação feita de imediato é a de uma figura masculina: um homem gay. Diante dessa perspectiva, parte considerável de mulheres que se relacionam exclusivamente com outras mulheres, optaram por abandonar essa nomenclatura para se referir a si mesmas, preferindo identificar-se como lésbicas, surgindo então o termo lesbofobia, que são as várias maneiras de negatividade com relação a mulheres que se relacionam com outras mulheres.
Caracteriza-se como homofobia a discriminação (que pode ir desde à agressão verbal à agressão física) contra pessoas homossexuais. De certa maneira, esse conceito vem sendo amplamente difundido por diversos veículos midiáticos. Embora isso seja de extrema importância para que as pessoas passem a conhecer essa palavra, assim como ocorre com a palavra homossexual, a conceptualização da homofobia corre também o risco de pôr em evidência as pautas de pessoas do sexo masculino, ainda que as mulheres possuam suas demandas e vivências específicas.
A mulher lésbica acaba vivenciando situações ampliadas de preconceito tanto por ser mulher quanto por gostar de pessoas do mesmo sexo. “A vivência e as violências sofridas por uma lésbica estão intimamente atreladas ao fato de ser mulher, e ser lésbica também altera a visão que a sociedade tem de você enquanto mulher. Por isso, há a necessidade de um conceito diferente do da homofobia para designar a discriminação contra mulheres lésbicas: a Lesbofobia”, explica Angélica, 38, professora da rede pública em Bauru.
Para entender a lesbofobia, uma das primeiras observações a se pensar é a invisibilidade lésbica, já que elas tem a sua sexualidade questionada desde o momento em que se assumem. “É comum escutar que “isso é só uma fase”, um momento passageiro e a nossa afetividade não é tratada com seriedade”, complementa Angélica. Quando a lesbianidade passa a ser acreditada, a mulher passa comumente a ser percebida sob duas óticas: a do fetichismo e a da hostilização.
Ao digitar a palavra “Lésbica” no Google, por exemplo, aparecem logo nas primeiras páginas apenas sites de pornografia voltada para homens heterossexuais. Se as mulheres de alguma forma não permitem esse “acesso” masculino aos seus corpos, a reação então passa a ser de hostilização. Essa receptividade hostil atinge em primeira instância as lésbicas que não se caracterizam tão femininas e que não atendem ao padrão estético, e são acusadas por muitos de querer ser homens e também por isso, sofrem o preconceito de frente, por serem lidas de imediato como lésbicas.
No que diz respeito à saúde sexual de mulheres lésbicas, essa invisibilidade fica ainda mais evidente. “Não há nenhuma atenção com a saúde da mulher lésbica. O prazer da mulher, em geral, é um mito ou tabu e como consequência disso não há, por exemplo, informação ou métodos de prevenção a doenças sexualmente transmissíveis (DSTs), se não improvisadas, para relações entre mulheres” comenta Angélica.
Lesbofobia no dia a dia
Tal identificação imediata demonstra a intolerância das pessoas, principalmente no mercado de trabalho. Juliana, 26, é garçonete em uma lanchonete de Bauru e conta que já teve de se retirar de um ambiente para evitar confusão com clientes.
“Quando fui retirar a bandeja da mesa do casal, o homem a tomou da minha mão e disse que não queria que eu o atendesse. Eu fiquei totalmente paralisada”. Após ouvir dos clientes que não queriam ser atendidos por uma “sapatão”, a profissional achou melhor esperar a saída dos mesmos para depois voltar ao posto de trabalho.
“Eu não queria fazer nenhum tipo de bagunça porque gosto de trabalhar lá. A lanchonete não tem culpa de ter recebido clientes com essa visão. Preferi me recolher. Mas me senti muito mal. Principalmente quando notei a proporção que podia tomar e a gravidade do que tinha acontecido”, relata.
Mesmo mesmo já tendo passado por situações desconfortáveis com os olhares e julgamentos ao andar pelas ruas, Juliana conta que viver essa experiência no ambiente de trabalho a pegou desprevenida. “Pensando melhor depois do ocorrido, eu sabia que ter o cabelo curtinho e um visual mais ‘masculinizado’ influenciava naquela reação, mas naquele momento minha sexualidade não era importante. Pode até ser a primeira coisa que você nota, ou a primeira coisa que você supõe, ou até a coisa que mais te incomoda… Mas sinto dizer que existem coisas mais significativas em mim”, conclui.
Infelizmente, não há muitas políticas públicas para mulheres lésbicas pois ainda não existem dados suficientes para os levantamentos necessários. A falta de informações específicas e a inexistência de um sistema seguro e não-hostil para que as mulheres possam denunciar seus agressores, gera dados insuficientes e distantes da realidade. Com poucas informações e poucos dados é difícil confrontar o Estado e justificar políticas públicas. “Um grande passo na construção de políticas públicas para a população lésbica é o mapeamento de suas necessidades e violências. Os poucos dados e a falta de iniciativas do Estado para fazer um banco de dados eficaz sobre essa população resulta em uma certa falta de “munição” para que os grupos de pressão cobrem do Estado providências”, opina Angélica.
Mais do que falar sobre invisibilidade lésbica, é importante dar visibilidade à elas, e voz para que exponham suas vivências e possam se defender e lutar contra os preconceitos. Ao passo que a sociedade tem mostrado certa aceitação, aos poucos, das pessoas que fazem parte do grupo LGBTTT (que incluem, além das lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros) muito ainda feito para que essas mulheres simplesmente possam ter liberdade para ser o que quiserem.
Repórter: Victor Moura
Produção Multimídia: Adauto Nogueira
Edição: Vandressa Vellini
Foto de capa: Mãos entrelaçadas (Créditos: Ana Luísa Agostinho)