Racismo e a lei
Saiba como é tratada a discriminação racial no âmbito jurídico
Nas últimas semanas, o câmpus da Unesp de Bauru foi palco de atos racistas (Intolerância sem rosto) no banheiro do Departamento de Comunicação Social. Com ofensas à mulheres e professores negros e até mesmo desenhos de suásticas, o caso tomou proporção nacional. Uma comissão de professores foi formada para averiguar os fatos, fazer levantamento de informações e também obter dados que possam indicar a autoria das pichações. Porém, atos como os que aconteceram na Unesp podem gerar dúvidas, juridicamente falando. Afinal, o que é considerado racismo? E injúria racial? Como devemos proceder quando isso acontecer?
Sobre os termos usados, o advogado Luciano Olavo da Silva explica que injúria racial consiste em ofender a dignidade ou o decoro de alguém utilizando elementos relativos à raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência. Já o racismo constitui uma segregação, uma maneira de afastar as pessoas do acesso pleno e irrestrito a determinados espaços da sociedade, com base em critérios de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.
Segundo Luciano, o que aconteceu no câmpus se encaixa no crime de racismo. “A meu ver, as mensagens pregavam uma segregação, passavam a ideia de que a Unesp não deveria ser um lugar para professores e alunos negros. Em outras palavras, as mensagens induziam ou incitavam uma discriminação, ou segregação, com base na cor das pessoas”, explica o advogado.
Preconceito, discriminação e racismo também possuem suas diferenças. “O preconceito é uma ideia pré-concebida de uma suposta superioridade de um grupo social em relação a outro pautado pela ideia da raça”, explica Juarez Xavier, coordenador do Núcleo Negro da Unesp para Pesquisa e Extensão (NUPE) e uma das vítimas dos ataques racistas encontrados no banheiro do departamento. Já a discriminação, segundo o professor, é a segregação física de grupos humanos. “Tem que ter política para forçar o ingresso desses grupos no exercício da cidadania, então tem as cotas, políticas de ação afirmativa, políticas universais, políticas pontuais”, comenta. E, por fim, Juarez explica que o racismo nada mais é do que a execução física da população negra, independente da subjetividade e do comportamento dessas pessoas. “No mapa da violência do Brasil, dos 56 mil homicídios, 77%, quase 80%, é de jovens negros, pobres, da periferia. Isso é racismo”, afirma.
O sistema de cotas adotado pela universidade, o crescente número de coletivos dentro do câmpus (de negros, mulheres e LGBT+) e a criação do NUPE podem ser fatores desencadeadores das pichações racistas, por causa dos constantes debates que esses grupos promovem sobre preconceito e minorias. “Realmente os fatos da vida cotidiana apenas desencadeiam o racismo, não criam o racismo. Ele é criado culturalmente, e quem os cria são os grupos sociais que frequentamos (família, escola, clubes, amigos etc), por intermédio de um ensinamento emocional”, conta Luciano.
Para evitar que mais casos ocorram, Luciano explica que a resposta pode estar além dos muros das universidades. “É preciso dar uma resposta repressiva, punindo os responsáveis, a fim de promover a expiação pelo mal causado. Contudo, não se pode perder de vista que essa expiação deve ter também um viés pedagógico, que, por intermédio do exemplo, desestimulará que a conduta seja repetida pelos próprios infratores ou por terceiros, demonstrando que o crime, diante da punição recebida, não compensa”, explica.
Luciano esclarece que a punição não extingue o racismo, porque não extingue as emoções associadas a ele. Ela apenas impede que o racismo se manifeste de modo ostensivo na sociedade, sem exterminá-lo dentro dos indivíduos. “O racismo só pode ser extinto com a extinção da cultura da segregação e dos sentimentos associados, e isso é muito complexo, pois envolve extinguir as causas que levam à percepção de uma necessidade de segregar”, afirma. Além da repressão penal, é preciso haver oportunidades em quantidade e qualidade para todos, com a eliminação da disputa irracional de espaços sociais.
O que fazer?
As pessoas que forem vítimas de racismo ou injúrias raciais devem buscar a atuação das instituições e agentes públicos que têm o dever legal de atuar na repressão da conduta. “O indivíduo deve reunir as provas testemunhais e materiais que tiver e levar o caso ao Ministério Público e à Polícia, exigindo as providências investigativas e processuais requeridas pelo caso”, explica Luciano.
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Reportagem: Marina Moia
Produtora Multimídia: Giovanna Diniz
Editor: Vinícius Cabrera
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