Famílias homoafetivas: amor e dedicação incondicionais
Desconsiderando o conceito heteronormativo de família nuclear como o único passível de ser intitulado “família”, encontramos diversas outras formações: algumas pessoas são criadas apenas pela mãe, outras pelo pai, alguns por avós, tios, tias, e também há famílias formadas por dois pais ou duas mães. De acordo com o último Censo do IBGE (2010), há 60 mil famílias homoafetivas no Brasil.
Recentemente, o deputado federal David Miranda, que é o primeiro vereador LGBT do RJ, casado com Glenn Greenwald (um dos fundadores do The Intercept) e pai de dois filhos, publicou em sua rede social mensagens de apoio à comunidade e contra a homofobia, mostrando inclusive outras famílias homoafetivas, como a de Angelo e André Nunes.
Em entrevista ao Repórter Unesp, Angelo Nunes, 46, diz que família é formada por seres que convivem e que se amam. Ou seja, “não importa se são amigos, parentes sanguíneos (ou não), o importante é o amor que há ali”. Ele é casado com André Nunes, 43, ambos estão juntos há mais de 16 anos e são os pais de Jonathan e Valentina.
Nas redes sociais são conhecidos, respectivamente, como Papai e Papía (@papai_e_papia) e costumam publicar registros de momentos em família, mostrando assim uma rotina repleta de amor e cuidado.
Ele conta que um dos momentos mais marcantes foi quando buscaram os filhos e voltaram para casa como uma família. Assim como quando as crianças pararam de chamar Angelo e André de “tio” e começaram a chamá-los de “PAPAI” e “PAPÍA”.
Adoção e rotina familiar
Segundo Angelo, o processo de adoção levou cerca de um ano e a burocracia foi a mesma enfrentada por pretendentes heterossexuais. “Não passamos por qualquer tipo de constrangimento ou situação desconfortável, seja com o juiz ou com funcionários do fórum”.
Afinal, famílias homoafetivas são como todas as outras que se constituem através de respeito, afeto e que demandam dedicação: “É café da manhã, escola, lição de casa, banho, passeio, sacolão, mercado, comprar roupa, brincar, almoçar, jantar, levar na natação… apresentar o mundo a elas”, conta Angelo sobre a rotina com as crianças.
O psicólogo Murilo Ultramare, 40, afirma que não há diferenças entre uma criança ser criada por pais héteros ou homossexuais. “Os cuidados são os mesmos, a criança tem que brincar, que se desenvolver, aprender, se sentir amada, protegida, precisa poder se abrir. Não há diferença de uma criança de um casal homoafetivo e de um casal hétero.”
Preconceito e intolerância
Entretanto, muitos ainda sofrem com a homofobia e Angelo acredita que uma das formas de se combater isso é incentivar o diálogo sobre o tema nas escolas. “Todo menino e menina LGBT que é notado na escola, sofre. Sofre mesmo e sofre muito. Jovens têm cabeça aberta para ouvir e acolher novos conceitos, ideias e informações.”.
Segundo o psicólogo, vivemos uma cultura na qual a responsabilidade pela educação da criança é muito atribuída a figura da mulher. Ou seja, as escolas perpetuam isso quando dirigem seus comunicados, reuniões, festinhas, etc., sempre para as mães.
“Uma criança numa união homoafetiva com dois pais não tem mãe, então deve se tomar cuidado com esses endereçamentos”, diz Ultramare. Portanto, estar atento a esses detalhes é um dos primeiros passos para a normalização de outros formatos familiares e a diminuição da homofobia.
Angelo afirma que sua família não sofre preconceito pessoalmente e que muitos os acompanham através do Facebook e Instagram de forma positiva. Contudo, Angelo relembra: “O deputado David Miranda fez um post e a foto da nossa família o compôs. Um homem ligou no meu local de trabalho falando coisas como: “Quem vai na escola das crianças no dia das mães? Jesus e Bolsonaro acabarão com a família de vocês”.
Sendo assim, Angelo comenta sobre a intolerância atualmente e que “o novo governo aliado a fanáticos e extremistas religiosos liberam e endossam o que há de pior nos seres humanos: o ódio”. Para ele, há uma onda de ódio e perversidade que é possível observar pelo aumento do número de violência contra mulheres, LGBT, religiões de matriz africana, nordestinos, negros, pobres, entre outros grupos.
Diálogo com famílias heterossexuais
“Nós temos procurado sair das nossas bolhas e participar de bate-papos com pais heterossexuais”. Dessa forma, ambos têm sido convidados a dar depoimentos em grupos que se encontram para falar sobre paternidade.
Portanto, a participação de famílias homoafetivas nesses ambientes é importante pois contribui com que pais heterossexuais entendam o seu papel no combate a homofobia e ensinem o mesmo a seus filhos. Afinal, “é nossa responsabilidade construir seres humanos melhores do que nós”, diz Angelo.
Repórter: Rafaela Thimóteo
Produção multimídia: Caroline Doms
Editora: Maria Eugênia Martelli